«Casas vazias. Gente sem casa»

Esta constatação, escrita na Praça da Alegria, está repetida um pouco por toda a cidade de Lisboa, e é associada a um partido político, o Bloco de Esquerda, que começou por lutar por ideais como este e inscrever esta afirmação em prédios abandonados.

«Tanta casa sem gente. Tanta gente sem casa» ou «Aqui podia morar gente» são slogans políticos bem conhecidos, mas também uma constatação que deveria preocupar-nos realmente. Mais do que vermos aqui uma crítica política, deveríamos ver a urgência social. No entanto, assim não é. Como pergunta Javier Marías, numa crónica no El País, a propósito de outro tema: «Porque vemos tudo como forma de denegrir, e nada como admiração e homenagem, ou, mesmo, como inveja sã?» Acaba, porém, concluindo, com Ortega y Gasset, que: «O malvado descansa de vez em quando; o tonto nunca!»

Ora a situação económica do País tem levado a que muitas pessoas, por excesso de dívidas ou por terem sido despedidas, deixem de ter uma casa onde morar e acabem por ter de ir morar com familiares, muitas vezes com pais, já reformados, que, com a sua pensão, sustentam filhos desempregados e netos estudantes. Também muitas pessoas, pelos mesmos motivos, ou outros, se encontram em situação de dificuldade económica, sem poderem garantir alimento para si e para os seus.

Felizmente, a necessidade é terreno fértil para a solidariedade, e há diversas instituições que apoiam estas famílias, dando-lhes comida, vestuário ou apoio financeiro. E a criatividade tem levado a que surjam projetos inovadores, que permitem garantir a estas famílias os bens essenciais, de que necessitam. Muitas vezes o que sobra a uns é exatamente o que falta a outros, e quando os bens são redistribuídos é mais fácil assegurar que todos têm, pelo menos, um pouco.

O trabalho de tantas e tantas instituições, fruto da organização da sociedade civil, ou da generosidade de alguns beneméritos, tem resultado na partilha do «pão» simbólico que a tantos falta. Como no poema de Vitorino Nemésio: «Eu sei o pão de cada dia e trago-o: / Ontem, como amanhã, já hoje mo dão; / Mas, vago, a meio da dentada, trago-o, / E não é bem o mesmo ou então não posso… // Ou pelo menos não é todo nosso / Este que levo à boca, o nosso pão.»

Mas nem só de pão vive o homem. Também temos necessidade de outros «alimentos» não materiais, como o carinho, o amor, a amizade. E há tanto de que sentimos falta…

 

Maria Eugénia Leitão

Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services