Depois das últimas sondagens e dos comícios do fim de semana, o candidato da “França Insubmissa”, Jean-Luc Mélenchon, apoiado pela Frente de Esquerda, que agrupa comunistas e dissidentes socialistas, acredita que pode chegar à segunda volta. Conta com isso, com uma dinâmica em crescendo e com o facto de os eleitores de esquerda, percebendo que o candidato do Partido Socialista não tem quaisquer hipóteses, estarem a engrossar as suas fileiras. Nas últimas sondagens, Hamon desce 3% nas intenções de voto e Mélenchon sobe 4%. Em França há uma divisão da esquerda em várias candidaturas. As mais fortes, depois da desistência dos ecologistas, são a de Melénchon, Hamon e do candidato do Novo Partido Anti-Capitalista (o equivalente ao Bloco de Esquerda), e somam mais de 30% das intenções de voto, mas a sua dispersão faz com que possam não conseguir ir à segunda volta. Isso já aconteceu, por exemplo, com o socialista Lionel Jospin em 2002.
Mas o que se pode estar a passar em França é a implosão do Partido Socialista. A impopularidade do atual presidente socialista François Hollande, que nem sequer se recandidata, conjugada com a fuga dos seus eleitores de direita para Macron – sinalizada pelo candidato derrotado nas primárias dos socialistas, o antigo primeiro-ministro Manuel Valls, que afirmou não ir votar no candidato do seu partido, Benoît Hamon, mas em Emmanuel Macron – e dos socialistas de esquerda para Mélenchon, faz com que os socialistas possam obter um resultado pouco superior aos 5%, o que configuraria uma derrota histórica com consequências incalculáveis para o último partido histórico da esquerda francesa ainda com alguma expressão eleitoral. Os comunistas, que já chegaram a ser o maior partido de França depois da ii Guerra Mundial, há muito que se tornaram quase residuais, embora presentes na frente que apoia Mélenchon: um dos seus antigos secretários-gerais, Robert Hue, é hoje apoiante da candidatura de centro de Emmanuel Macron.
Os socialistas franceses sofrem do problema que atingiu quase toda a social-democracia, excetuando o PS português, o SPD alemão e poucos mais: foram entalados entre a sua governação económica à direita, respeitando as regras ditadas pelos diretórios europeus, e o aparecimento de novos movimentos e partidos à sua esquerda que contestavam as práticas neoliberais.
Perante este cenário, o candidato da “França Insubmissa” apareceu confiante perante 70 mil pessoas que o esperavam em Marselha, dizendo: “Não contem senão com as vossas forças. Eu farei a minha parte do meu trabalho, conto com vocês para fazer a vossa.” O cenário desta passagem a uma hipotética segunda volta das eleições, embora muito difícil, não é impossível, até porque o candidato oficial do Partido Socialista, Benoît Hamon, já disse na televisão pública francesa que, caso não passasse da primeira volta, gostaria de poder votar em Mélenchon.
Outro resultado que, a confirmarem-se as sondagens, pode provocar outro terramoto político – desta vez na direita – é se François Fillon se ficar pelo quarto lugar nas eleições. O candidato d’Os Republicanos, principal partido francês, teria assim um humilhante resultado, depois de ter sido dado como vencedor virtual destas presidenciais de 2017 – uma situação que se deve à sua teimosia de se manter na campanha apesar de estar indiciado num escândalo de corrupção que envolve a sua mulher e filhos.