Outrora uma corrida a dois, a eleição transformou-se num concurso imprevisível entre quatro candidatos com hipóteses reais de chegarem à segunda volta. Existem dois concorrentes de extremos tradicionais opostos – Le Pen e Mélenchon – coincidentes na sua postura anti-UE e globalismo. Do lado reformista apresentam-se o Republican Fillon e a surpresa, o europeísta Macron.
É lógico que qualquer uma destas opções promove um caminho distinto e isso tem estado patente no nervosismo crescente. Os mercados abominam incerteza e esta realidade exprime-se no prémio de risco da dívida gaulesa, que recentemente bateu máximos face à alemã. Estamos perante uma minicrise de confiança que se irá esbater ou agravar brutalmente dependendo se a vitória recair para o polo reformista ou para a antítese.
Porém, qualquer que seja o presidente eleito o seu poder será sempre condicionado pela Assembleia Nacional, que pela sua génese tem muito menos hipóteses de produzir distribuições não moderadas. Isto significa que será altamente improvável haver um salto quântico em termos de euro-integração caso ganhe Macron, sendo igualmente improvável surgir o apocalipse sob forma de Frexit no caso de Mélenchon/Le Pen. A chamada ‘co-habitation’ entre Presidente e Assembleia evitará que se acelere tanto em direção ao oásis como em direção ao abismo.
O expectável impacto económico no caso benigno será uma Europa com capacidade de aproveitar o atual período de crescimento para continuar com a sua integração gradual, especialmente em áreas como a defesa e energia, sem esquecer a finalização da união bancária. No cenário adverso – que poderá despoletar logo após a primeira volta com a ‘combinação pesadelo’ – o choque de (des)confiança obrigaria a União a voltar ao gabinete de crise para apagar vários fogos. O agravar da situação no mercado de dívida forçaria o BCE a agir com veemência, reativando o programa OMT. As decisões de consumo e investimento privado seriam contagiadas, levando a um abrandamento que teria de ser estancado por via de um aumento significativo do Plano Juncker, que assumiria assim um estatuto quasi-Marshall. O efeito mais dramático seria porventura a expectável corrida aos bancos que obrigaria a França a instituir controlos de capital temporários semelhantes aos da Grécia e Chipre.
Os mecanismos de resposta existem, mas será claramente mais agradável contrariar Jean Monnet quando disse que a «Europa será forjada pela soma das suas crises». Qualquer que seja a escolha dos franceses, nenhuma representará o capítulo final da história do projeto europeu. Felizmente, as probabilidades nesta fase indicam que a via mais extremada não passará de uma conjetura.
*Gestor de portfoliomulti-activo no BIG – Bancode Investimento Global