os ingleses popularizaram a expressão ‘mr. Right’. É mais giro que ‘o homem certo’, mas a ideia é a mesma. Quem é ‘o homem certo’? Nunca se sabe. Ou cada um sabe de si. O homem certo de alguém será o errado da miúda do lado. Sabe-se lá. E depois mesmo quando achamos que sabemos tudo sobre um alegado homem certo há aquele momento em que a nossa certeza se afunda. Ou treme. Ou anda de um lado para o outro como as ondas do mar.
A Vanessa apareceu aqui no jornal. Eu estava afogada em trabalho, mas não posso dizer que não à Vanessa.
– Senta-te aí. Vai buscar um café. Ou uma coca-cola zero.
A Vanessa instalou-se no meu gabinete que é uma assoalhada extremamente agradável – das janelas vê-se um edifício industrial antigo e umas árvores – contígua à do meu colega Vítor Rainho, diretor executivo deste jornal. Eu, como diria Jerónimo de Sousa, estava com um olho no burro e outro no cigano: um no meu trabalho, o outro nas tretas que a Vanessa ia desfiando com o vagar que infelizmente a mim me faltava. Além das palavras homófonas, homónimas, homógrafas e parónimas, existe esta categoria estranha das palavras que parecem iguais ao seu significado. Acho que não há nome para isso. ‘O vagar’ é uma dessas, faz parte da semântica para sensorial.
– Por que razão só me saem duques e cenas tristes?, perguntou a Vanessa.
Eu parei o meu trabalho.
– Estás a falar de quê em concreto?
– Dos homens.
Os homens! O que nós, mulheres, adoramos falar ‘dos homens’, assim, em pacote.
– Mas o que é agora?
– Andei a meditar sobre qual será a razão profunda de eu me meter sempre com os homens errados.
Oh, eu tinha tanto que fazer, juro. E que resposta se pode dar a uma conversa destas? Homens errados, azar com os homens, o caraças. As mulheres andam desde o princípio do mundo a discutir estes assuntos. E estes temas, por muito dinheiro que deem a quem escreve livros de auto-ajuda, não têm resposta. Nem há cura para isso, por muito que as mulheres em geral achem que há e estejam prontas a gastar 17 euros num manual para ‘acertar’ nos homens. Tem o mesmo valor de ir à bruxa.
— Ó Vanessa, não faço ideia. As coisas são como são.
– Achas então que me devo conformar com isso? De andar sempre a meter-me com os homens errados?
— Não, acho que não te deves conformar. Nunca nos devemos conformar com nada. Tirando com algumas coisas.
– Mas então devo pensar nisso, certo? Na razão profunda em que me tenho andado a meter com os homens errados?
– Não necessariamente.
– Achas que não devo pensar nisso? Estás parva? Isto é um assunto muito sério! Por muito menos há uma enorme quantidade de gente que anda a fazer psicoterapia!
– Então, se quiseres vai fazer psicoterapia.
Eu tinha chegado àquela fase em que já não estava a ouvir bem o que a Vanessa dizia, porque o tema não era interessante e não havia nada a debater. Mas em 10 minutos ela deu um salto e emitiu um gritinho de felicidade.
– O Francisco mandou-me uma mensagem.
– Quem é o Francisco?
– Um gajo que conheci na semana passada.
– E o que é que diz?
– Hummm, acho que diz umas coisas simpáticas. Coisas com potencial.
– Mostra a mensagem.
O SMS era de uma banalidade aterradora. Lá ia a Vanessa entusiasmar-se outra vez pelo homem errado. Ou lá o que é. Estive quase para lhe dizer, mas achei que seria cruel: e mais vale uma Vanessa entusiasmada por um tonto qualquer do que ‘desentusiasmada’ em geral. Não devemos conformar-nos com nada, exceto com algumas coisas.