Contestação a Assunção Cristas sobe de tom no CDS

A proposta para as estações do metro de Lisboa e a coligação com o PPM e o MPT em Lisboa geraram incómodo entre dirigentes centristas e a líder do partido. Cristas sob pressão.

Depois de declarações controversas, sondagens desconfortáveis, uma proposta polémica e um conselho nacional tenso, pode dizer-se que a direção de Assunção Cristas no CDS-PP já viveu dias mais felizes.

Ao que o SOL apurou, antes de Assunção apresentar na Assembleia da República uma proposta de aumento da rede do metropolitano de Lisboa, a ideia não foi discutida entre o grupo parlamentar – seja com o líder de bancada ou com o deputado encarregue da pasta dos Transportes – nem com os seus vice-presidentes de partido. 

O CDS foi tomado por surpresa por Assunção e alguns reagiram. 

João Almeida, porta-voz do partido, admitiu não conhecer «os detalhes da proposta para o metro de Lisboa». Mais importante, do seu ponto de vista, é saber que, «para o CDS, nunca as estações do Metro de Lisboa passarão à frente da requalificação da Linha do Vouga, da solução para o Metro Mondego ou da expansão do Metro do Porto».

Além do facto de um porta-voz de partido assumir não estar ao corrente de uma proposta feita pelo partido, Almeida insistiu, coincidentemente, no mesmo ponto que Filipe Lobo d’Ávila, deputado, apelando a uma agenda nacional e não somente focada em Lisboa, cidade em que Cristas também é candidata autárquica. 

Lobo d’Ávila, que liderou uma lista alternativa à de Cristas para o Conselho Nacional do partido, afirmou que «Lisboa é importante mas o País não se esgota nem se resume a Lisboa» e que «todos os portugueses merecem igual preocupação, sem exceções». 

Raúl Almeida, também conselheiro nacional com Lobo d’Ávila e antigo deputado, recordou que «Portugal não é só Lisboa». 

O lado inesperado e pouco esclarecido na apresentação da proposta – sem dizer o custo ou a origem do financiamento em concreto – suscitou os referidos avisos internos e críticas do PSD e do PS. 

Nas redes sociais, os socialistas recordaram um discurso em que Cristas, então parlamentar na oposição a José Sócrates, defendeu que o «Estado pode dar sinais mais claros não se comprometendo com grandes obras públicas que agravam o endividamento do país».

Com o avolumar da polémica, tudo ficaria um pouco mais retificado e esclarecido numa conferência de imprensa realizada ontem (ver página ao lado). 

No Conselho Nacional, todavia, Cristas fez mesmo referência ao Facebook de modo a condenar os seus próprios criticos internos, nomeando Lobo d’Ávila e Raúl Almeida e os seus «jantares». A paz que se alcançara no partido, muito em respeito à jornada autárquica a enfrentar este ano, quebrou. 

Esta semana, Cristas apresentou o MPT (Movimento Partido da Terra) e o PPM (Partido Popular Monárquico) como parceiros de coligação em Lisboa e a ocasião também não ficou órfã de problemas. 

Além do acordo conferir o terceiro e quarto lugar aos monárquicos e aos ecologistas na lista de deputados à Assembleia Municipal – concessão que não é consensual na estrutura local do CDS – Assunção Cristas viu Gonçalo Câmara Pereira, vice-presidente do PPM, descrevê-la como «uma mulher casada, que provou, como a maioria das portuguesas que pode trabalhar e ter filhos», visto que «não descurou o trabalho e não descurou a casa».

«Como mulher, a dr.ª Assunção Cristas sabe bem que, para se trabalhar, não se pode usar espartilho nem a saia travada, a saia tem de ser larga e, se necessário, vestir calças, calças que ultimamente não se sabe onde andam», adiantou ainda Câmara Pereira. 

Assunção deu retorno à sapiência e disse, no Largo do Caldas: «Tenho calçado botas e calças de ganga muitas vezes para estar nos bairros sociais junto das pessoas que não conhecem visitas por parte do executivo camarário, excetuando da polícia quando é para os pôr fora das suas casas». E choveram novamente críticas nas redes sociais. Isabel Moreira, deputada do PS, escreveu na sua página pública que o sucedido era «inacreditável». O presidente demissionário do PSD/Lisboa, Mauro Xavier, ironizou: «Agora está mais claro porque não quisemos coligação?».

«Depois das declarações do vice-presidente do PPM, não sei se este apoio tira menos votos do que aqueles que nos dá», lamentou um dirigente local do CDS.

O dia que apoquenta as hostes centristas

Depois da sucessão de controvérsias mediáticas, de picardias internas e de tensões com o Partido Social Democrata após revelar conversas tidas em Conselho de Ministros durante o governo Passos, a estrutura começa a prever um resultado menos sorridente no dia das eleições locais, a 1 de outubro deste ano. Mas a grande interrogação vai, na verdade, para o dia seguinte de Assunção.

O modo como tentou puxar as orelhas aos críticos, sabe o SOL, é encarado como nervosismo perante o crescendo de descontentamento interno.

A tendência alternativa Esperança em Movimento continua a receber assinaturas, as concelhias mais distantes da capital não gostam de ver o esforço autárquico concentrado em Lisboa – tanto a nível de cartazes quanto do ponto de vista orçamental – e já se pensa no próximo congresso, em 2018.

Aí, o problema de disponibilidade dos eventuais sucessores é comum à direita. Nuno Melo, ainda feliz em Bruxelas como eurodeputado e Filipe Lobo d’Ávila, embora não descarte a convocatória também preserva o percurso profissional como advogado. As críticas têm sido mais de insatisfação com a situação atual do partido do que motivadas por ambição de cargo. 

João Almeida, ex-líder da Juventude Popular (JP), curiosamente com  Lobo d’Avila a vice-presidente, é visto como «a reserva de luxo» para a liderança, apesar da vontade também não ser imensa. Pedro Mota Soares também é apontado como mais consensual a nível da estrutura. O problema, diz fonte da bancada democrata-cristã, «é que ela não compreende nem quer compreender o aparelho». «Se em Lisboa tiver mais que Portas (7%), mas não entrar nos dois dígitos não sei se chega: não pode justificar erros seus por haver descontentamento interno», adianta ainda, ao SOL. 

Quem tem ganho alguma preponderância com esse descontentamento é o atual presidente da JP, Francisco Rodrigues dos Santos. «É natural», prossegue a mesma fonte, que requisitou anonimato, «ele é o oposto dela: homem, conservador, mobilizador, da estrutura». «Conseguiu ser uma lufada de ar fresco: tem ideias e tropas no terreno, está em todo o lado e trabalha mais que alguns deputados». 

Apesar da secretaria-geral do partido torcer o nariz ao protagonismo de Rodrigues dos Santos, o grupo parlamentar não o rejeita, até acolhendo propostas da ‘jota’. «Aquilo não é fazer oposição ao partido, aquilo é o partido», esclarece um deputado centrista. «Se ele [Rodrigues] não é o futuro imediato, será o futuro de certeza». 

Com a bancada a temer o emagrecimento de lugares que as próximas legislativas avizinham – crescendo o Partido Socialista, em governo, e prejudicando a direita – os parlamentares centristas não pretendem entrar em choque com a presidente do partido. Face aos resultados económicos e a popularidade do executivo de António Costa, a vontade de ser líder na oposição também é escassa. «Porque acha que Passos ganhou o último congresso com 95% dos votos?», ironiza a mesma fonte, em jeito de conclusão.