NATO. Trump gela aliança

O presidente americano disciplinou os parceiros por não cumprirem mínimos de despesa militar e não se comprometeu com o artigo 5.º.

Não era segredo nenhum que o encontro desta quinta-feira entre líderes da aliança transatlântica em Bruxelas foi pensado especialmente para acolher o novo presidente norte-americano e reassegurá-lo de que os outros países tencionam aumentar a sua despesa militar para responder às críticas e que o combate ao terrorismo é também uma prioridade sua. Em troca, os líderes da NATO esperavam ouvir de Donald Trump o que o novo líder americano ainda não declarou de forma clara, rompendo com todos os seus antecessores: o seu compromisso com o artigo 5.o da aliança, segundo o qual um ataque contra um membro é um ataque contra todos e que, mais do que um pilar fundamental, é a sua razão existencial.

O presidente americano até tinha o momento perfeito para o fazer, ao final da tarde, quando se desvendou nas novas instalações da NATO um monumento aos ataques do 11 de Setembro, na forma de vigas retorcidas de metal que sobraram das Torres Gémeas, em cuja base está uma alusão ao único momento em que o artigo 5.o foi invocado na história da aliança, precisamente em resposta aos atentados da Al-Qaeda. Antes da cerimónia, aliás, a NATO comprometeu-se formalmente com a aliança de ataques aéreos contra o Estado Islâmico na Síria e no Iraque, em que vários países já participam a título próprio.

Sermão

A passadeira estava lá, mas Trump desperdiçou ostensivamente a oportunidade. Não só o novo presidente americano não disse explicitamente que se compromete com o artigo 5.o como por boa parte do seu discurso censurou os parceiros da aliança por não cumprirem o mínimo de investimento nacional em defesa exigido nos tratados da NATO, correspondente a 2% do cada PIB. E fê-lo a poucos metros dos restantes líderes, que durante o seu discurso olharam entre si ora com desconfiança, ora com chacota. O mais próximo que o presidente americano chegou a comprometer-se com a mútua defesa foi dizer que os Estados Unidos “nunca esquecerão os amigos que estiveram do nosso lado”. O principal, porém, foi o sermão.

“Os membros da NATO devem enfim contribuir com a sua quota-parte e dar resposta às suas obrigações financeiras”, lançou Trump, ao lado do secretário-geral da aliança. “Mas 23 das 28 nações-membro continuam sem pagar aquilo que devem pagar e têm de pagar”, prosseguiu. “Isto não é justo para o povo e contribuintes norte-americanos e muitas destas nações devem grandes quantias de anos passados”, lançou ainda, retomando um raciocínio pelo qual já foi criticado antes, uma vez que parece sugerir que os países da NATO pagam anuidades para beneficiar da defesa norte-americana quando, na verdade, os países têm mínimos de despesa com os seus próprios orçamentos militares.

Frieza e divisão

Trump continuaria a ter reuniões até à noite, mas esta quinta-feira parecia irremediavelmente marcada pelas imagens de frieza ou beligerância entre o presidente americano e parceiros. Primeiro, o seu cumprimento com Emmanuel Macron, o novo líder francês, em que os dois chefes de Estado parecem entrar numa pequena guerra entre quem consegue dar o passou-bem mais forte. Mais tarde, as imagens do encontro com Donald Tusk e Jean-Claude Juncker, os presidentes do Conselho Europeu e Comissão Europeia, respetivamente, em que os três deram provas físicas da sua distância – Tusk disse mais tarde que UE e Washington não estão de acordo em temas como comércio, ambiente e Rússia. Antes da cerimónia do monumento ao 11 de Setembro, as câmaras capturaram Trump a empurrar um líder da NATO para se colocar à frente do grupo e, uma vez no mesmo estrado que os outros parceiros para a fotografia de grupo, o representante da imprensa descreveu a evidente falta de química: “Alguns interagiam uns com os outros no palco, mas Trump, não:_permaneceu em silêncio, alterando algumas vezes a postura e olhando para baixo.” “[Não vi] quaisquer líderes a falar com Trump após a fotografia.”