O feminismo contra a democracia?

Dizer que a violação é cultural põe Portugal ao lado de países onde casar com raparigas de 12 anos é legal

Surgiu um vídeo revelador de promiscuidade universitária. Não é grande novidade. O ‘Correio da Manhã’ partilhou o vídeo e os jornalistas que gostavam de vender tanto quanto o ‘Correio da Manhã’ insultaram o diário. Também não é grande novidade. Os amantes da personalidade de José Sócrates, recheados de eventuais saudades, juntaram-se à festa contra o CM. Menos novidade foi. Este semanário também conhece bem o número. 

Independentemente de a menina exposta no vídeo ter optado por não apresentar queixa contra a invasão à sua intimidade, toda a circunstância não deixa de ser lamentável e preocupante. Portugal não desiludiu e reagiu de forma igualmente lamentável e preocupante.

Esta semana, em Lisboa e no Porto, deram-me manifestações contra a «cultura do assédio e da violação».

Eu  acho muito bem que mulheres e homens se manifestem contra assédios e violações, como é evidente. Também o faço. Mas não deixo de achar mal que uma manifestação utilize o termo «cultura de violação» para o nosso país.

Dizer que a violação é algo «cultural» põe Portugal ao lado de países árabes onde o casamento com raparigas de 12 anos é legal e tradição.

Claro que é muito mais fácil nacionalizar um problema que concretizar uma solução. Será certamente mais fácil ser feminista no Bairro Alto do que em Meca. Podiam era não cuspir na bandeira pelo meio.

Qualquer assédio é um assunto que não se pode ignorar, não deixando de haver uma diferença entre ignorar um problema e dizer que ele é cultura de um país.

Seria a mesma coisa que dizer que «como há sírios a praticar terrorismo, a Síria tem uma cultura terrorista». E não me parece que isso fosse resolver o problema do terrorismo.

Na plataforma feminista ‘Capazes’, também esta semana, publicou-se um artigo que defendia ser «tempo de retirar aos opressores o poder de oprimir», logo, «a suspensão temporária do poder do voto dos homens brancos» seria a única hipótese de «produzir uma real alteração no mundo» em uma geração.

Alguém vai manifestar-se contra uma cultura anti-democrática no feminismo por causa disto?

Entretanto, imagino o que vem aí: machista, chauvinista, reacionário, nazi, etc.

Isso reconforta-me pelas posições que defendo para transtorno dos meus amigos mais conservadores: que a paridade nos governos de Macron e de Justin Trudeau é valorosa, que o Estado não devia cobrar imposto sobre produtos relacionados com a menstruação ou que Donald Trump devia ter saído da corrida presidencial depois de gabar-se de assediar uma mulher.

Não são propriamente as ideias mais patriarcais do comentário político.

Deixo, por último, um beijo à articulista do monumento democrático publicado nas alegamente ‘Capazes’. Um longo e elegante beijo de um homem, branco, católico e conservador, que se Deus quiser há-de votar até ao fim dos seus dias. 

 

P.S. – Carlos César, presidente do Partido Socialista e líder do grupo parlamentar, revelou que prefere «o interior» a «destinos turísticos», como o Algarve. Sendo que o país cresce à custa do turismo, talvez fosse boa ideia o sr. César pedir desculpa e repensar a retórica. Os turistas em Ponta Delgada podem não achar grande graça.