Estes fenómenos têm criado espaço algumas demagogias destrutivas socialmente, mas também algumas visões estratégicas positivas, na medida em que os povos se cansam do status quo de corporativismos, tal como de escândalos de políticos que deveriam ser exemplos de integridade.
Na ordem do dia está o Brexit, que deve ser enquadrado apenas como um dos momentos mais recentes da história geoestratégica da Europa. É bom relembrar que se tratou de uma decisão de um povo soberano europeu, o qual tem a relevância pela sua grande história, sua cultura de autonomia e de interesses vincados de independência, perante uma Europa Continental. Este sempre foi um povo que olhou para os europeus continentais com alguma desconfiança, dado que os vê como uns ‘tipos’ que não sabem bem o que querem, razão pela qual historicamente só se aproxima quando vê benefícios próprios concretos. E, diga-se, ultimamente esses benefícios têm sido muito escassos.
A reação ao Brexit, por parte dos políticos europeus, foi a já típica e cansativa reação de quem tem medo de afetar os interesses e o status quo. Ao invés da preocupação com uma verdadeira definição estratégica politica, económica e social para a Europa, preocuparam-se em apresentar uma história de crianças: o ‘Papão vai levar o Reino Unido à falência!’. Mas, a realidade vai ser outra, conforme também acontece na verdadeira história do ‘Papão’! O ‘Papão’ nunca apareceu!
As razões, para ‘ele’ não aparecer, são simples e várias! O Reino Unido não é um país ‘qualquer’. Londres é uma das principais praças financeiras do mundo. A Libra é uma moeda forte, que sempre teve vida própria. A máquina pública e legislativa britânica ir-se-á tornar mais ágil, libertando-se da subjugação da máquina burocrática de Bruxelas. E… ninguém na Europa quer um país vizinho instável, em particular na atual fase instável do mundo.
A história indica-nos que o Reino Unido sabe negociar bem, acrescendo que terá 2 grandes aliados geoestratégicos, em polos opostos mas com objetivos iguais: os EUA e a Rússia.
Ambos têm interesse numa Europa fraca e desagregada, como a atual ou ainda pior! Estas potências mundiais, para reforçarem a influência económica e política, irão dar o máximo de apoio possível ao Reino Unido, que aproveitará de forma inteligente. A Rússia procura ainda que a desagregação europeia lhe traga a influência de outrora, recebendo de braços abertos os países da Europa de Leste iludidos com o «sonho europeu», tipo programa de televisão Perdoa-me.
Em conclusão, arriscamo-nos a que a União Europeia seja o projeto «do quase»: o quase que era uma união económica, o quase que era uma potência política mundial, o quase que era um país, o quase que era…
Rui Ribeiro
*Executive Director | LISS – Universidade Lusófona Information Systems School