Guns N’Roses. O quartel sem guerra

A reconciliação foi possível e a reunião mais aguardada desde final do séc. xx também. Os Guns N’Roses, ou parte deles, chegam hoje a Portugal. Vinte mil estrangeiros vêm de propósito 

No íntimo toda a gente acreditava, mas ninguém queria assumi-lo. Slash já dera os parabéns a Axl Rose no Twitter. Não recebeu o troco mas ficou o sinal. O guitarrista e restantes membros da formação clássica dos Guns N’Roses mostraram abertura para uma reunião, à medida que as bandas satélite e outras aventuras megalómanas como os Velvet Revolver (os Guns N’Roses instrumentais com a voz rouca de Scott Weiland dos Stone Temple Pilots) implodiam. De Axl Rose, o mau feitio do grupo, nem uma sílaba.

No verão de 2015, os Guns N’Roses substitutos começaram a deixar a banda aos pingos, quando se especulava sobre as gravações do sucessor de “Chinese Democracy”, o álbum por que foi necessário esperar década e meia. E os rumores do reencontro da formação clássica cresceram quando o baterista Frank Ferrer afirmou a banda estava a passar por um “processo de mudança”, usando o termo “evolução”. 

O Natal foi tardio para os fãs mas valeu a pena esperar pelo presente mais saboroso. A reunião mais desejada de final dos anos 90 era real. Restava saber se com a formação clássica completa ou parte dela. Primeiro em Coachella, o centro de todas as atenções mundiais, e depois o resto do mundo.

Chegaram os vídeos, as fotos nas redes sociais e nem uma bala para amostra em palco, na opinião pública ou em qualquer outro oráculo da vida moderna. Quando Axl Rose esteve em Lisboa para se sentar no trono dos AC/DC, não só antecipou a vinda dos Guns N’Roses como deixou a imagem de um homem novo. Sorridente, magro e disponível para falar. Além do agudo intacto, atravessou o trovão rock’n’roll dos australianos e impôs a sua voz. Não só fez esquecer Brian Johnson – afastado da digressão devido a um problema auditivo que o deixou em risco de ficar surdo “ad eternum – como conciliou fãs divergentes. Ou parte deles. Se fosse necessária uma peça para encaixar neste puzzle improvavelmente pacífico, ela aí estava. 

 “Achávamos todos que não ia acontecer, por isso ainda não acreditamos. Parece surreal, mas toda a gente se está a dar bem e depois de termos percorrido um longo caminho, está a ser fixe”, reagiu Slash com a maior das naturalidades no programa de rádio do baterista dos Aerosmith, Joey Kramer, também ele um dinossauro com doutoramento na escola de vida do rock’n’roll.

É o regresso a um tempo quimérico de grandiosidade em que as pessoas cantavam solos como quem fixa refrões na cabeça, e rasgava as calças de ganga em atitude provocatória para com pais e professores. E talvez não seja a última página. Axl Rose já afirmou que música nova dos Guns N’Roses com Slash e Duff McKagan faz parte da agenda do grupo. 

O reencontro só foi possível porque Axl Rose e Slash comunicaram pela primeira vez em 19 anos em 2015 e a conversa chegou a bom porto. E claro, porque foi possível chegar a um acordo milionário e justo para todas as partes, o motivo porque os bateristas da primeira vida não vieram, permitido, além do mais, quando o guitarrista se separou da mulher Perla Ferrar. De acordo com o “Daily Mail”, Axl não gostava dela por ser controladora. Duff McKagan, que já participara num concerto, fez a ponte. 

Na história do rock’n’roll, só a reunião dos Led Zeppelin poderia gerar semelhante fervor. 20 mil estrangeiros, entre os quais 15 mil espanhóis, confirmam-no hoje no Passeio Marítimo de Algés.