Sofia Boutella. “Aprendi muito com o Tom Cruise”

   

Um dos monstros mais icónicos do cinema regressa à vida em “A Múmia”, que chegou esta semana às salas. Tom Cruise é Nick Morton, um militar e caçador de artefactos que descobre algo muito mais perigoso do que alguma cez sonhou. Quando localiza o sarcófago – ou melhor, a prisão – de uma antiga princesa egípcia chamada Ahmanet, liberta para o mundo uma força terrífica à procura de vingança numa fúria amarga. E a libertação deste mundo escondido de deuses e monstros terá consequências para Nick e para todos os que o rodeiam. Sofia Boutella, que começou a sua carreira como modelo e bailarina, apareceu como a letal Gazelle em “Kingsman: Serviço Secreto” (2014), mais recentemente interpretou Jaylah em “Star Trek: Além do Universo” (2016) e, além de “A Múmia”, havemos de vê-la ainda este ano ao lado de Charlize Theron em “Atomic Blonde”, de David Leitch. Neste regresso de “A Múmia”, por Alex Kurtzman, produtor de “Star Trek: Além do Universo”, Boutella é Ahmanet, uma princesa injustiçada do antigo Egito que regressa ao mundo atual e com ela traz o caos. Nesta entrevista Boutella fala sobre os desafios exigidos pela personagem, sobre o trabalho com o realizador Alex Kurtzman – quis prestar neste seu segundo filme uma homenagem ao orignal de “A Múmia” de 1932 – e explica por que inicialmente teve dúvidas sobre se devia aceitar este papel. 

Como é que o realizador, Alex Kurtzman, lhe apresentou a personagem?

Pediu-me para nos encontrarmos porque inicialmente eu estava muito hesitante em relação ao papel. Queria encontrar o lado psicológico, as razões que a levam a fazer o que faz. Então sentei-me com ele e a primeira coisa que ele disse foi: “Dá-me notas, diz-me o que pensas.” Eu disse-lhe que era uma honra ter uma personagem feminina forte no filme mas que não queria que ela fosse um monstro sem nenhuma explicação sobre o que a tinha tornado assim. Era essencial que ela tivesse uma história forte, e que isso fosse claro para que as pessoas compreendessem e para criar um ritmo, espaço suficiente para retratar algo em várias camadas. Quando vemos, por exemplo, o Heath Ledger a fazer o Joker no “Batman: O Cavaleiro das Trevas”, ele não diz muito sobre a sua história, mas sentimos que há algo a acontecer muito mais profundo do que aquilo que vemos. E queria mostrar isso. Quando vemos o Boris Karloff n’ “A Múmia” original de 1932, ele é muito calmo. Não há nada de monstruoso nele na verdade e isso tem muito poder. Não era importante que ela se levantasse para assustar as pessoas de forma estranha. Então, quando o Alex me apresentou a sua versão de “A Múmia” chegámos a este entendimento. O Alex ia à procura da versão de 1932, queria prestar-lhe uma homenagem respeitando o que tinha sido feito e isso interessou-me e levou-me a querer fazer a Ahmanet.

Já tinha visto o filme original. Foi revê-lo depois de aceitar o papel ou quis manter alguma distância e encontrar a sua própria interpretação?

Em projetos anteriores senti que não devia ir ver o que tinha sido feito antes, mas neste lembrava-me do impacto que o filme tinha tido em mim quando era mais nova, por isso quis revisitá-lo. Cresci a ver os filmes do [Carl] Laemmle [“Drácula” (1931), “Frankenstein” (1931)] porque a minha família o fazia e havia neles uma subtileza que eu admirava e valorizava. O Boris Karloff foi muito reconhecido pelo que fez e construiu uma carreira incrível. Quando revi o filme, também estava interessada na força de Ahmanet. Pesquisei sobre o antigo Egito, sobre a mitologia do país, sobre os faraós e as rainhas e como viviam. Mesmo que a Ahmanet não o tenha sido, é uma princesa iludida, a viver como se fosse tornar-se rainha, portanto age como se fosse. O que me parece comum entre todas estas pessoas é o facto de não se moverem mais depressa do que precisam. Nunca levantam a voz e comandam tudo a partir de algo muito mais profundo do que aquilo que se vê. Para isso achei que seria interessante ir ver o que o Boris tinha feito e como o fez como um homem. Queria encontrar um equilíbrio que funcionasse hoje, nos filmes atuais e encontrá-la. 

O processo de maquilhagem era difícil desta vez?

Havia alguma maquilhagem um bocadinho pesada em termos de coloração mas não foram necessárias próteses. A equipa de efeitos visuais trabalhou o meu rosto, mas a questão da cor implicou muito tempo na cadeira de maquilhagem. Tive que ser digitalizada muitas vezes! Foi um longo processo mas percebo por que o fizeram. O aspeto da Múmia era essencial para que o filme funcionasse. O Alex disse-o e estava absolutamente certo. É um papel e uma personagem tão icónica que isso não se pode perder, portanto é preciso tentar tudo e ir afunilando. É bom que a imagem que encontrámos seja tão poderosa e forte e orgulho-me muito do resultado. Valeu a pena!

Tendo em conta o seu background da dança, a fisicalidade do papel foi simples para si?

Tivemos tempo para trabalhar em todos os aspetos e fomos treinados. Quando a Ahmanet se mexe por ter sido atacada, ou nas sequências de ação, tudo isso foi ensaiado com a nossa maravilhosa equipa de acrobacias. O Wade Eastwood e a sua equipa são pessoas incríveis e muito reconhecidas pelo seu trabalho. Estávamos sempre acompanhados. Nas partes que são menos físicas, tive que ser eu a chegar lá. Pesquisei e pesquisei personagens histórias através de pinturas e o que outros escreveram sobre elas. Foi também assim que aprendi sobre como os faraós, as rainhas e as princesas desse tempo se comportavam. A postura da Ahmanet é muito nobre e forte e ela comanda a partir do seu corpo. 

Como foi trabalhar com o Tom Cruise?

É um homem adorável. Ama o cinema e fazer filmes. Tem um lado de criança que é muito bonito de se ver e o seu entusiasmo é inestimável, foi uma experiência muito feliz. Aprendi muito com ele, o Tom estava sempre disponível. Aparecia sempre, tivemos grandes conversas e trocas de experiências. Adorei trabalhar com ele e voltaria a fazê-lo sem pensar. 

Como foi trabalhar com o Alex Kurtzman? Pediu-lhe para ver alguma coisa para lhe dar uma ideia do tom de que estava à procura?
 

Acho que falamos a mesma língua e fomos percebendo a dinâmica da personagem ao longo da rodagem. Estávamos a tentar um outro lado da personagem que não tínhamos explorado o suficiente e ele deu-me algumas referências de filmes como a Kathy Bates em “Misery – O Capítulo Final” [Rob Reiner, 1990] ou a criança de “O Último Imperador” [Bernardo Bertolucci, 1987]. Tinha a ver com uma sequência específica que foi acrescentada e que ainda não estava incorporada na minha personagem. Temos que ser maleáveis, não podemos ser inflexíveis nem ficar agarrados a uma ideia. Ver filmes como estes serviu-me de inspiração para encontrar ainda mais camadas para a minha personagem. 

Há alguma coisa que esteja curiosa para ver na versão final?

Estou ansiosa por ver a escala desta produção e todo o trabalho que fizemos na maquilhagem. 

O que espera que as pessoas levem do filme?

Espero que as entretenha e que se divirtam. Espero que se assustem mas que também se riam um bocadinho. Um aspeto que foi incluído neste filme que não estava no original é o humor, é interessante explorar-se isso, considerando o assunto em questão. É uma nova fórmula que acho que vai resultar.