O mundo político ficou espantado pelo elogio que Schäuble, o radical ministro das Finanças da Alemanha, fez a Mário Centeno. Schäuble terá dito que Mário Centeno é «o Ronaldo do Ecofin»: ou seja, está entre os melhores do mundo na sua atividade.
Em rigor, não sabemos se foi elogio ou despeito. Mas, presumindo-se o elogio, oculta-se a autocrítica. Ninguém fica reconfortado com elogios vindos de quem ainda há meses acusava Centeno de encaminhar Portugal para uma calamidade e postulava o mérito da política seguida pelo anterior Governo, que fez da obediência o seu pensamento europeu.
Schaüble é um ortodoxo que quer formatar a Europa – através no núcleo central da Zona Euro e do seu braço político, o Eurogrupo – às regras do PPE que são as que orientam os interesses nacionais da Alemanha no processo de consolidação e de aprofundamento institucional europeu. Nesse rolo compressor, as opções democráticas dos povos são muitas vezes um pormenor a desconsiderar. Assim, qualquer sucesso de um projecto político e económico alternativo na Europa é uma ameaça à hegemonia da direita que confunde a ‘realidade’ com o seu programa, fora do qual não pode haver caminho a percorrer.
Portugal é por isso um desafio e um problema para os liberais. Cumprindo disposições orçamentais que podem e devem ser mudadas à escala europeia (como o Tratado Orçamental), o nosso país chegou a metas que outros propuseram mas não conseguiram atingir e fê-lo com um programa de recuperação dos rendimentos e da economia que triunfou enquanto desafiava os dogmas dominantes.
Desta forma, antes do elogio de Schaüble pela evidência dos resultados, venha o reconhecimento do fracasso da sua política e a autocrítica sobre ideias ideologicamente radicais que lançaram a Europa na vertigem da crise, da austeridade e dos consequentes populismos em vários países.
Se Centeno é hoje consensualmente reconhecido como um dos mais competentes ministros das Finanças que Portugal já teve, isso resulta da sua ousadia em combater modelos dominantes (que ainda há dias criticou a propósito do FMI) e em contestar abertamente aqueles que procuram fazer de uma ciência social – como a economia – uma ciência exacta à custa do experimentalismo dos povos.
Centeno é o «Ronaldo do Ecofin» porque rompeu com os treinos que lhe tinham prescrito. O elogio de Schaüble é a derrota de Schäuble. E de todos os que ainda o seguem.