Theresa May queria estabilidade para enfrentar as negociações rumo ao Brexit, mas na rifa eleitoral da passada quinta-feira saiu-lhe precisamente o oposto. Volvidos dois anos de um dos maiores suicídios políticos da História da velhinha democracia britânica – protagonizado por David Cameron, o ex-primeiro-ministro tory que, depois de conquistar Westminster, em 2015, foi obrigado a entregar as chaves do nº 10 de Downing Street, no ano seguinte, na ressaca do referendo à Europa –, é agora a vez da atual líder do Partido Conservador chamar a si todos os argumentos, e mais alguns, para abraçar destino semelhante, depois de, numa eleição convocada para legitimar a sua liderança, ter perdido uma maioria parlamentar, uma posição de vantagem, somada e anímica, sobre o Labour Party e a pouca credibilidade política que ainda tinha.
Face ao descalabro eleitoral, agravado pelas promessas de afastamento, de May, em caso de perda de deputados para os trabalhistas, não são poucos os que querem ver a primeira-ministra pelas costas ou que, mesmo não querendo, vaticinam-lhe um futuro efémero, à frente dos destinos do país. Em declarações ao “Sunday Mirror”, Jeremy Corbyn prometeu não desistir da ideia de poder vir a liderar um governo, a muito curto prazo, raciocínio confirmado pelo próprio, hoje, ao jornalista da BBC, Andrew Marr. “Não podemos continuar neste período de enorme instabilidade”, defendeu o líder do Partido Trabalhista, apontando a realização de novas eleições “no final do ano” ou “no início do próximo”. “Temos um programa, temos apoio e estamos prontos para lutar numa nova campanha eleitoral, assim que possível”, afiançou.
O antigo ministro das Finanças do executivo de Cameron, e agora editor do “London Evening Standard”, também aposta num futuro sem Theresa May, bem mais breve do que se pode pensar. Munido com o mesmo sorriso trocista que já tinha apresentado na noite eleitoral, enquanto comentador político na ITV, George Osborne afirmou que May pode cair já “a meio da semana”e catalogou-a como “uma mulher morta que ainda caminha”.
Aliança suspeita e por confirmar
Não foi apenas a decisão de se manter no poder, em contradição com os sinais por si transmitidos durante as últimas sete semanas, que desagradou a praticamente todos os lados do espetro político do Reino Unido. A solução encontrada pela primeira-ministra para manter a cabeça à tona da água não convence a oposição e tem provocado embaraço junto dos conservadores.
No sentido de lograr os 326 deputados necessários para estabelecer uma maioria na Câmara dos Comuns – os tories ficaram-se pelos 318 – May estendeu a mão aos 10 deputados eleitos pelos “amigos e aliados” do Partido Democrático Unionista (DUP), um grupo político ultraconservador, da Irlanda do Norte, opositor do casamento entre pessoas do mesmo sexo, anti-aborto e pouco virado para as discussões sobre alterações climáticas, entre outras posições polémicas.
Para além disso, um acordo que supostamente já estaria fechado, afinal ainda não tem pés para andar. Da troca de comunicados contraditórios no sábado à noite, entre os tories e os unionistas, terá resultado o agendamento de um encontro, entre Theresa May e a líder do DUP, Arlene Foster, para a próxima terça-feira. Só depois dessa reunião é que sairá um compromisso de apoio do partido mais representado da Irlanda do Norte no parlamento ao governo minoritário conservador.
Questionado sobre as posições mais controversas do DUP, em matérias sociais e de direitos humanos, e sobre a forma como esse tipo de postura pode vir a afetar o acordo governamental, Michael Fallon, ministro da Defesa, fez questão de distanciar os tories dos unionistas, defendendo que aquilo que está em causa é a simples procura de uma aliança baseada numa estratégia de economia e segurança. “O facto de eles [DUP] terem acordado apoiar-nos, nos principais desafios económicos e securitários que o país atravessa, não significa que concordamos com todas as suas posições. Não concordamos, nem temos de concordar”, insistiu, em declarações à BBC.
Mas nem todos os conservadores partilham da visão de Fallon. De acordo com o “Independent”, Graham Brady, líder do 1922 Committee – o grupo parlamentar dos tories –, estará a fazer pressão para que uma reunião marcada para terça-feira, envolvendo todos os deputados conservadores eleitos para Westminster, seja antecipada para amanhã, para que aqueles possam ser notificados sobre os pormenores do acordo que Theresa May vai propor a Foster e ao DUP.
Para muitos, a reunião do grupo parlamentar pode ser a derradeira hipótese para a primeira-ministra provar que ainda tem condições para liderar o Reino Unido. Mas as eleições antecipadas já não o tinham sido? Talvez seja preferível, por enquanto, guardar no bolso as fichas de apostas.