Os Emirados Árabes Unidos (EAU) anunciaram ontem que o embargo aéreo é apenas para as companhias aéreas do Qatar ou registadas naquele país. A Arábia Saudita e o Bahrein emitiram comunicados semelhantes. Este embargo começou a 5 de junho com o corte das ligações da Arábia Saudita, Egito, EAU e Bahrein ao Qatar, numa contenda em que a aviação civil é um dos principais perdedores.
O principal alvo deste embargo é a Qatar Airways, a uma das grandes companhias áreas do mundo, que está no centro da tentativa do Qatar se tornar num hub turístico.
A interdição do espaço aéreo dos países vizinhos significa que os voos da Qatar Airways têm de fazer desvios significativos caso voem para África ou para a Europa, por exemplo. Em termos operacionais é mais difícil para a companhia, que consome mais combustível e arrisca perder os slots nos aeroportos.
O embargo “proíbe todas a companhias aéreas e aviões registados no Qatar” de aterrarem ou transitarem no espaço aéreo de EAU, Arábia Saudita e Bahrein.
O embargo não se aplica às companhias ou aviões não registadas no Qatar que queiram usar o espaço aéreo destes países para voar de e para o Qatar.
De acordo com os comunicados, há uma exceção para aviões privados ou charters para e desde o Qatar, que precisam de permissão para transitar no espaço aéreo destes países.
Na segunda-feira a Qatar Airways pediu à Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO na siga inglesa) que considerasse este boicote ilegal e uma violação da convenção de 1944 sobre transporte aéreo internacional.
A ICAO – organismo das Nações Unidas criado para gerir e administrar a Convenção de Avião Civil Internacional (Convenção de Chicago) – trabalha com os 191 Estados e representantes do setor da aviação que esta Convenção que tem como objetivo encontrar padrões, práticas e políticas que garantam uma aviação civil segura, eficiente, economicamente sustentável e ambientalmente responsável.
“Céus abertos”
O CEO da Qatar Airways considerou o embargo aéreo dos países vizinhos um “bloqueio ilegal”. Ontem, e em resposta a esta posição, as autoridades de aviação sauditas afirmaram que o encerramento do seu espaço aéreo era o direito soberano do reino para proteger os seus cidadãos de qualquer ameaça e é uma medida de precaução.
O Qatar, mas também os EAU, são desde há muito grandes defensores de políticas de “céus abertos” que eliminem as restrições para os voos entre os países.
Estas políticas têm ajudado as principais companhias aéreas dos países do Médio Oriente – Emirates, Ethiad Airways e a Qatar Airways – a tornarem-se os grandes elos de ligação para os passageiros que viajam entre o Ocidente e o Oriente.
“Do ponto de vista da indústria é desapontante quando as companhias aéreas são apanhadas em sensibilidades políticas mais amplas que impedem os benefícios da concorrência e da escolha dos consumidores que distinguem a região”, disse um especialista em aviação à agência Reuters.
No total, há 18 destinos interditados à Qatar Airways, que também foi obrigada a encerrar as delegações da Arábia Saudita, mas também nos EAU.
“O encerramento de delegações da companhias áreas é de facto um comportamento incivilizado. As companhias aéreas não são braços políticos”, disse o CEO da Qatar Airways à CNN. “Fomos rotulados como uma organização criminosa. Não fomos sequer autorizados a reembolsar os passageiros”, acrescentou Akbar Al Baker.
As autoridades de aviação civil dos EAU dizem estar completamente comprometidas com a Convenção de Chicago, mas, tal como a Arábia Saudita, o país alega que se reserva o direito de tomar medidas de precaução se a sua segurança nacional estiver em causa.
Uma semana depois do corte de relações dos vizinhos e de vários outros países, o Qatar estabilizou.
O governo de Doha parece ter garantido que consegue manter a economia a funcionar apesar das restrições e cortes e o ministro das Finanças qatari revelou que o embate do confronto económico não é grave. Doha consegue controlar os estragos económicos e tem recursos para aguentar a pressão.
A disputa fez mossa nas importações de comida e outros materiais e levou a que alguns bancos estrangeiros restringissem as suas operações. Algumas das suas fábricas de comida estão a fazer turnos extra para processar as importações de comida de outros países, como o Brasil, e as linhas de navegação de transporte de contentores foram redirecionadas dos EAU para Omã.
Gás natural
A segurança alimentar é um dos aspetos principais da contenda, uma vez que 40% dos alimentos consumidos no Qatar chegam por terra. Sem a possibilidade de usar a fronteira terrestre – a única é com a Arábia Saudita e está fechada – o Qatar fica seriamente limitado nesse campo.
A Arábia Saudita e os EAU forneceram 309 milhões de dólares dos 1050 milhões de dólares de importações de comida do Qatar em 2015. A maioria, principalmente os laticínios, passa pela fronteira terrestre da Arábia Saudita. Em entrevista à CNBC, o ministro das Finanças do Qatar, Ali Sherif al-Emadi, disse que o governo de Doha está “muito confortável com a sua posição, o seu investimento e a sua liquidez”.
O setor energético opera com normalidade – o Qatar é o maior exportador de gás natural do mundo – e o impacto nas importações não foi especialmente sentido. Para além disso o país pode importar da Turquia Extremo Oriente ou Europa e segundo o governante vai responder à crise diversificando ainda mais a sua economia. “As nossas reservas e fundos de investimento representam mais de 250% do nosso produto interno bruto”, disse Ali Sherif al-Emadi.
Enquanto as exportações de gás estiverem a funcionar o país de 2,7 milhões de habitantes deverá estar imune a uma recessão séria. E o crescimento económico, alimentado por despesa pública e projetos de infraestruturas, deverá continuar.