KAZAN – Tem início já amanhã, no Estádio Krestovsky, na magnífica São Petersburgo, que já foi Petrogrado e Leningrado e nunca deixará de ser a cidade de Pedro o Grande que Dostoiévski definiu como “a mais abstrata e intencional urbe do mundo”, a décima edição da Taça das Confederações, a oitava organizada sob a égide da FIFA e, muito provavelmente, a última a que poderemos assistir, tendo em conta os novos ditames que irão subverter de alguma forma os calendários do futebol mundial.
Rússia e Nova Zelândia, adversárias de Portugal no grupo A, dão o pontapé de saída, deixando para domingo o Portugal-México, aqui em Kazan, e o Camarões-Chile, do Grupo B, em Moscovo.
Orgulhosa dos seus galões de campeã da Europa, a selecção nacional, que um dia Ricardo Ornellas, um dos mestres do jornalismo, apelidou de Equipa-de-Todos-Nós, vê nesta sua primeira presença na prova a possibilidade da conquista de um troféu que ficaria a matar nas vitrinas da sede da federação, lado a lado com a Taça Henry Delaunay, atrativamente brilhante no seu desenho prateado. É tempo de tropeçar no céu como se ouvisse música, com licença de Chico Buarque. Fernando Santos não recusou essa vontade. Bem pelo contrário. Voltou a sublinhar durante a última semana: “Enquanto eu estiver neste posto, Portugal entra em todos os jogos para ganhar”. Assim será, então, depois de amanhã, frente aos mexicanos, pelas 18 horas de Moscovo, como é prática no território russo, na Arena de Kazan, assim um bocado para lá do sol posto, na República do Tartaristão, na confluência do Volga e do Kazanka, em tempos soviéticos conhecida como Tartária, terra dos tártaros.
Foi em 1992 que a Federação da Arábia Saudita teve a interessante ideia de realizar uma competição envolvendo os vencedores da Copa América, da Taça das Nações Africanas, da Taça da Ásia e da Copa de Ouro da CONCACAF. Meias-finais, final e jogo para os terceiros e quartos lugares, tudo em três dias de Outubro, meio à pressa por vicissitudes mais do que compreensíveis, com vitória dos argentinos sobre os sauditas no jogo decisivo de Riade (3-1).
O primeiro passo estava dado.
1995 Três anos mais tarde, em 1995, nova dose. Também na Arábia Saudita. Chamava-se, na altura, Campeonato Intercontinental. E passava a contar com o vencedor do Campeonato da Europa. Sendo o Japão campeão asiático, acrescentou-se a equipa do país organizador, como não poderia deixar de ser. Seis participantes, já em dois grupos iniciais para apurar os semi-finalistas. Vencedor: Dinamarca, na final contra a Argentina (2-0).
Tudo piava, a partir de agora, mais fino.
Em 1997, já estávamos, muito mais prosaicamente, perante a Taça das Confederações. Com edição agendada de dois em dois anos. Entravam na liça o campeão do mundo (Brasil, no caso), o campeão da Oceânia (Austrália) e o finalista da Taça da Ásia, os Emirados Árabes Unidos, já que a Arábia Saudita voltava a apresentar-se como país organizador. O campeão europeu, a Alemanha, declinou a presença, chegando-se à frente o finalista do Euro-96, a República Checa. Atingia-se o número ideal de oito, divisível por dois grupos de quatro, tal como acontece actualmente. Vitória brasileira sobre os australianos: 6-0!
Entrava-se numa espécie de linha de montagem. E mudava-se de continente. A edição de 1999 teve lugar no México. A França, campeã do mundo em 1998, decidiu não participar. A prova disputou-se no início de Agosto, embora estivesse agendada para Janeiro.
Havia ainda muitas excrecências para limar. Ou, como diria Alexandre O’Neill, muita enxúndia para deixar de fora.
O México venceu o Brasil e, dois anos depois, já se encontrava estabelecido que a Taça das Confederações serviria para teste das fases finais dos Campeonatos do Mundo.
Coreia e Japão Como co-organizadores do Mundial de 2002, Coreia do Sul e Japão receberam a edição de 2001. E participaram nela, como está bem de ver. Com o campeão do mundo e da Europa confundidos na mesma selecção, a França (1998 e 2000), o México teve direito a entrar como titular.
Um França francesa como nunca até então. Vitórias atrás de vitórias até à vitória na final de Yokohama. Ao título mundial e europeu, somou o título confederativo, batendo o Japão por 1-0.
Autênticamente açambarcadora.
E insaciável.
Dois anos mais tarde, em 2003, seria a própria França a receber o torneio. Ganhou outra vez.
O drama fez parte dessa Taça das Confederações. E a morte.
Na meia-final de Lyon, entre a Colômbia e os Camarões, Marc-Vivien Foé caiu inanimado ao minuto 71. Minuto fatal. Uma hora mais tarde estava morto.
Os seus companheiros camaroneses quiseram oferecer-lhe a vitória na final de Saint-Denis.
A insaciável França não se deixou levar pelas emoções. Venceu por 1-0.
Nova era A partir de 2005, a FIFA estabeleceu que a Taça das Confederações só se disputaria nos anos anteriores às fases finais dos Campeonatos do Mundo. E, mantendo o princípio de que o grande objectivo era o de servir de teste aos Mundiais, sempre no país que, no ano seguinte, organizasse a prova.
A nova era teria, assim, início na Alemanha. Seguir-se-iam a África do Sul, o Brasil e a Rússia.
Abriu-se, igualmente, uma nova era no capítulo dos vencedores. O Brasil conquistaria todas as Taças das Confederações a partir daí, embora tenha ficado de fora da deste ano, que amanhã se inicia, pois não é, de momento, titular seja do que for.
4-1 à Argentina, em Frankfurt; 3-2 aos Estados Unidos, em Joanesburgo; 3-0 à Espanha, no Rio de Janeiro.
Melhor dizendo, então: é titular deste troféu agora em disputa de São Petersburgo a Sochi, passando por Moscovo e Kazan.
Mas isso não dá o direito de participação por ofício.
Não haverá Brasil na Rússia, para já, mas é dos poucos que já garantiu a presença no ano que vem. Portugal está cá, mas precisa ainda de batalhar por nova viagem. Fica para mais tarde. Há uma taça pelo caminho. A hora é no domingo. Será certamente a última.