Ao fim de quatro relatórios sabe-se que, afinal, nem tudo correu bem. Ao contrário do que tem vindo a ser dito por todas as entidades envolvidas no combate às chamas no incêndio de Pedrógão – IPMA, GNR, SIRESP e Proteção Civil –, o pedido de apoio da Proteção Civil para recuperar a rede SIRESP foi tarde demais para evitar a morte de 64 pessoas, revelou ontem a Secretaria-Geral da Administração Interna.
Houve cinco antenas da rede de comunicações de emergência e segurança (SIRESP) que entre as 19h38 de sábado e as 3h53 de domingo que faliram. Algumas arderam outras ficaram saturadas com o volume de chamadas, o que resultou na falha de comunicações entre as entidades que combatiam o incêndio.
Foram feitos dois pedidos de carros móveis, com antenas, para que fossem recuperadas as comunicações entre as autoridades, de acordo com o documento da Secretaria-Geral do MAI, que é responsável pela gestão da rede SIRESP. Um foi feito pelas 21h15, pelo próprio secretário de Estado da Administração Interna, Jorge Gomes, e quase 15 minutos depois, pelas 21h29, a Proteção Civil fez o mesmo pedido.
A essa hora, de acordo com a cronologia do relatório, já as comunicações tinham falhado há duas horas e ardido quatro antenas da rede SIRESP – a de Pedrógão Grande, a de Malhadas, a de Pampilhosa e a da serra da Lousã. E já tinham morrido 49 pessoas, incluindo as da estrada nacional 236-1. As restantes vítimas morreram até às 22h30 de sábado, período em que a rede de emergência e segurança não funcionava naquela zona.
Tarde demais para evitar estas mortes. Quem o diz é a Secretaria-Geral da Administração Interna, que aponta o dedo à Proteção Civil dizendo claramente que à hora do pedido dos carros de apoio “era já impossível ter a estação móvel em Pedrógão Grande a tempo de ajudar a minorar as ocorrências que resultaram em mortes”.
E a censura à Proteção Civil não fica por aqui. “Ao verificar que a situação se estava a tornar excecional, requisitando mais meios de combate ao incêndio”, a Proteção Civil, considera a Secretaria-Geral, “deveria também em simultâneo ter solicitado preventivamente a mobilização da estação móvel em tempo útil”.
É que, face à hora a que a ajuda foi solicitada, “nunca poderia ter chegado a Pedrógão Grande antes das 1h15”, sublinha o documento, que diz que seriam necessárias quatro horas para que o carro de apoio ao SIRESP se deslocasse de Lisboa a Pedrógão e fosse restabelecida a rede.
Antes do pedido de ajuda, o centro de operação e gestão da Secretaria-Geral do MAI, o serviço que gere o SIRESP, diz que “não teve da parte da Proteção Civil nem de nenhuma outra entidade utilizadora ou da operadora da rede qualquer relato da existência de dificuldades nas comunicações”, lê-se no documento.
nenhum carro de apoio estava operacional O relatório da Secretaria-Geral do MAI revela ainda que, no dia dos incêndios, nenhum dos dois carros de apoio estava operacional.
À hora do pedido da Proteção Civil, o veículo confiado à GNR, avariado desde a visita do Papa a Portugal, estava em Espanha desde o início de junho para ser reparado. O outro carro, confiado à PSP, estava numa oficina em Lisboa para que fosse à revisão, agendada para dia 19, dois dias depois do início do incêndio. Mas foi esta a viatura que acabou por chegar a Pedrógão Grande às 7h30 de domingo, sendo as comunicações do SIRESP restabelecidas duas horas depois, às 9h32.
Antes, a PSP comunicou à secretaria-geral que a viatura estava àquela hora indisponível pelas 22h48 de sábado, e o carro foi levantado da oficina às 3h10 da madrugada de domingo.
Perante este relatório, o Ministério da Administração Interna não teceu qualquer comentário ao i, mas Constança Urbano de Sousa assinou um despacho a pedir à Inspeção-Geral da Administração Interna uma auditoria que verifique se a Secretaria Geral do MAI cumpriu as “obrigações legal e contratualmente estabelecidas, designadamente ao nível da gestão, manutenção e fiscalização do SIRESP” – auditoria que a ministra quer pronta dentro de 30 dias.