KAZAN – Claro que perpassa pela alma de todos os portugueses que vieram à Rússia, seja por que motivo for, neste mês de Junho que acaba já amanhã, acompanhar a Seleção Nacional, uma sensação de fim de festa irremediável. A verdade é tal e qual como diz a canção de Martinho da Vila – tudo se acabou na quarta-feira.
Não vale a pena fingir que o jogo do próximo domingo, no Estádio do Spartak, em Moscovo, para decidir os terceiros e quartos classificados desta Taça das Confederações, será mais do que o que verdadeiramente é: zero, ou quase. Já tive a oportunidade de viver por dentro, no tempo em que trabalhava no grupo dos selecionados, uma situação destas. Acrescento, ao talhar da foice, que esta finalzinha dos pobres, tendo sido compreensivelmente abandonada nos Campeonatos da Europa, só teve a presença lusitana por duas vezes, no Mundial de 1966 e no Mundial de 2006, se deixarmos cair a história da luta pela medalha de bronze no torneio dos Jogos Olímpicos de 1996.
É difícil, mesmo muito difícil, meter na cabeça dos jogadores o mesmo espírito de conquista que tinha sido exibido até à derrota das meias-finais, frente ao Chile. É, portanto, entendível e equacionável (porque o problema atinge uma e outra equipa) um jogo distante daquilo que foram os outros até aqui.
Além do mais, Ronaldo foi embora, autorizado a ir ver o filhos recém-nascidos, pelo que iremos ter um Portugal-sem-Ronaldo e isso é muito significativo neste tempo em que Portugal-não-é-Portugal-sem-Ronaldo.
Enfim, assim vão as glórias do mundo.
Mortinhos por chegarem a casa, à moda do filme de Carlos Martinho e Jorge Sluízer, os rapazes de Fernando Santos sujeitam-se ao frete – vá lá!, deixemo-nos de eufemismos. Claro que haverá um discurso de orgulho ferido e de passos ainda por dar. Mas, sinceramente, ninguém no seu perfeito juízo irá agora dizer que a unidade da pátria está em causa, bem como o prestígio da sua representação desportiva maior.
Havia que esperar pelo menos pelas onze horas da noite de ontem, em Sochi, para se perceber os acasalamentos para a final e para o tal joguinho do terceiro e quarto lugares. Dois golpes de cavalaria alemã, logo de entrada, arrasaram os inoperantes mexicanos. Impôs-se a eficácia. Como de costume, a Alemanha traçava o seu destino de ganhar. E assim estará em São Petersburgo, repetindo-se os confrontos entre portugueses e mexicanos e alemães e chilenos. Está certo. No cômputo dos jogos concluídos até ao momentos foram as selecções que apresentaram mais qualidade em frequência.
E o Alemanha-Chile da fase de grupos foi uma partida com francos pontos de interesse, segundo observámos via televisão. Prevê-se, e com toda a propriedade, que Fernando Santos aproveite a oportunidade para deixar jogar aqueles que foram menos ou nada utilizados até aqui. Ele próprio já o deu a entender e, no fundo, perante a realidade dos factos, será da mais elementar justiça e espírito académico, se a antiquíssima expressão coimbrã me é aqui permitida. Veremos não tarda. Um adeus pode ser melancólico, mas traz geralmente consigo o início de alguma coisa.
A derrota.
Desperdiçar três penáltis, os primeiros três, e não dar sequer luta no amaldiçoado desempate, foi mau, mas também há que convir, com frieza, que os chilenos fizeram mais para estarem na final do que os portugueses. Foram mais duros, mais ativos e mais ambiciosos. Não se retira a Fernando Santos a audácia de um ou outro golpe, sobretudo na fase das substituições (as três dentro dos 90 minutos, mais a quarta do prolongamento). Não acertou em cheio, não senhor, mas mais pela forma improfícua como Nani e Quaresma se deram ao jogo do que pela ideia subjacente às mudanças. Já tirar André Gomes, que fez seguramente a sua melhor exibição ao serviço da seleção portuguesa, me pareceu precipitada e desajeitada.
Os derradeiros minutos do prolongamento seriam um martírio. O pior Portugal dos últimos dois anos, sem rebuço. Do céu caiu a estrela da sorte que só o final da noite apagou. Na forma como Alexis Sanchez cabeceou a milímetros do poste, no perdão misericordioso do árbitro ao penálti claro cometido por Fonte, nas bolas que bateram consecutivamente nos ferros como se fossem de “flippers”.
Às malvas as teorias! É comum esperar-se que tanta felicidade se prolongue até à felicidade final. Foi assim durante o Campeonato da Europa em França, mais os seus três prolongamentos e uma série de grandes penalidades, mas não o foi desta vez, em Kazan. Como dizia Mário Filho, o jornalista que deu nome ao Estádio do Maracanã, a vitória é uma doença que só a derrota cura.
Portugal perdeu. Perdeu bem, afinal.
Resta-lhe regressar às vitórias. Porque também a derrota é uma doença que só a vitória cura…