Geração i. Abdicar das férias? Por cá, a opção é mais o low cost

Para tentar perceber melhor os millennials portugueses e os seus hábitos de trabalho,  a Geração i fez um questionário online e obteve 252 respostas.

Questiona-se a importância de falar sobre os millennials com o argumento de que as anteriores gerações passaram pelos mesmos problemas e ultrapassaram o mesmo tipo de desafios. Mas será que isso é mesmo verdade? Nesta edição da Geração i  exploramos a vida laboral dos nascidos entre 1985 e 1995 e uma crise existencial que parecem estar a viver de forma mais vincada.

Universidades, consultoras, empresas e organizações empenham-se a todo custo na tentativa de decifrar esta geração, o que terá algum motivo. O contexto em que esta geração nasceu e as mudanças da sociedade ao longo da sua infância e adolescência contribuíram para um grupo de jovens adultos na sua grande maioria altamente qualificados, mas também “perdidos e isolados”, descreveu a “Harvard Business Review” em março do ano passado.

Esta publicação considera que um dos problemas dos millennials é estarem a viver a “crise do quarto de vida” com uma intensidade “nunca antes vista nas ouras gerações”.

 Em edições anteriores desta rubrica, que o i publica todas as quintas-feiras, já se deu voz aos que têm conseguido alcançar muitos dos seus objetivos ou aos que ainda não saíram da casa dos pais. Já se falou dos que não conseguem parar por muito tempo num único lugar, dos que são precários e dos que tentam fugir da realidade consumindo drogas e medicamentos. Também já se abordou o tema dos que perseguem a informação e dos que se recusam a ficar calados. Sistematizar tudo é a dificuldade, assim como perceber quão diferentes são os problemas.

Sobre o tema da depressão e da ansiedade que parece estar a ter maior incidência nos mais jovens, a “Harvard Business Review” assinala que “a idade média para o início da depressão que, há trinta anos começava por volta dos 40 anos de idade ou início dos 50 anos e agora, tem tendência para começar aos vinte e cinco anos de idade, esperando-se que comece ainda mais cedo”. Mas a chamada crise do primeiro quarto de vida – de que agora se começa a falar mais quando até aqui se ouvia sobretudo a expressão ‘crise da meia idade’ – parece ter outras manifestações e muitas estão ligadas ao mundo do trabalho, à rotina do dia a dia e àquilo a que ela obriga.

Segundo os investigadores de Harvard, tudo começa com uma sensação de prisão perante um determinado compromisso, seja ele no trabalho ou em casa. “As pessoas assumem empregos, alugam apartamentos e entram em relacionamentos. Sentem-se presos à idade adulta. Deixam os seus parceiros românticos, empregos ou grupos sociais e isolam-se”, explicam.

Segundo os estudos publicados por esta universidade americana, os jovens passam então esta crise existencial a refletir e a recalibrar os seus planos, sempre isolados, até que eventualmente saem e exploram novos passatempos, interesses e grupos sociais. Ultrapassada a turbulência, sentem-se mais motivados e mais lúcidos. O problema, assinala a “Harvard Business Review”, é que este processo pode durar anos ou repetir-se, tratando-se de uma fase dolorosa, mas que também deve ser encarada como “uma tremenda oportunidade de crescimento, pois pode criar indivíduos que lideram vidas mais significativas e mais felizes”.

 

O outro lado da moeda

Uma das constatações da literatura norte-americana sobre este tema é que, a certa altura, os millennials tentam usar os empregos como tábuas de salvação para todos os seus problemas, o que aumenta o risco de desequilíbrios na vida laboral.

Como sentem que nada é seguro nas suas vidas, pelo menos entre os jovens adultos americanos o que se nota é mergulharem cada vez mais num intenso ritmo de trabalho que os leva a um ponto de se recusarem a aproveitar as férias a que têm direito. Embora a cultura do trabalho dos Estados Unidos seja diferente da europeia, há uma certa tendência a considerar-se que os millennials trabalhadores estão a tirar cada vez menos férias, com medo de perderem oportunidades dentro das empresas  para que trabalham ou por não terem dinheiro para gastar e precisarem desses dias de trabalho ou, ainda, como forma de isolamento social.

De acordo com o projeto Time Off and GfK, os millennials norte-americanos são realmente mais propensos a verem-se com orgulho como “mártires do trabalho” do que os trabalhadores mais velhos e têm menos tendência a usar todo o tempo de férias a que têm direito. Os investigadores questionaram cerca de 5000 empregados a tempo integral com direito a um período de férias remunerado e descobriram que os millennials concordavam mais vezes com afirmações do género “mais ninguém na minha empresa pode fazer o trabalho enquanto estou fora”; “quero mostrar total dedicação à minha empresa e trabalho”; “não quero que os outros pensem que eu sou substituível”; “sinto-me culpado por usar o meu tempo livre pago”.

Em 2014, um inquérito da Associação Portuguesa de Psicologia da Saúde Ocupacional junto de 3619 representantes dos millennials revelou que sete em cada dez dizia sentir um vazio ao ir de férias. Entre os mais velhos inquiridos, apenas 4% tinha este sentimento. Só 6% dos mais novos vê nas férias a hipótese de repor energias, contra 73% dos mais velhos.

O i lançou um inquérito online ao qual responderam 252 jovens da Geração i. O objetivo era ter a perceção se os millennials portugueses estão ou não felizes no trabalho e se trabalham por necessidade ou por gosto, mas também que planos têm para as férias deste ano. É de recordar que este método de inquirir pessoas não é o mais fiável, uma vez que pela internet não podemos certificar-nos da veracidade das respostas. Ainda assim, ficam algumas pistas.

Responderam 143 (56,7%) mulheres e 103 (40,9%) homens. Quatro pessoas identificaram-se como tendo “outro” género (1.6%) e duas (0.8%) escolheram a opção de não dizer o seu género. Em termos de idades, 130 ( 51,6%)_inquiridos tinham entre 22 e 25 anos, 79 (31,3%) tinham entre 26 e 30 anos e apenas 43 (17,1%) tinham idades entre os 31 e os 35. Quanto à zona de origem, 151 jovens (59,9%) eram originais do Norte, 70 (27,8%) de Lisboa e Vale do Tejo, 20 (7,9%) da região Centro, cinco (2%) do Alentejo, dois (0.8%) do Algarve, um (0.4%) da Região Autónoma dos Açores e três (1,2%) da Região Autónoma da Madeira. De todos os inquiridos, 28 não residem em Portugal.

Segundo o inquérito, 43 (17,2%) dos 252 millennials inquiridos estão desempregados, 207 (82,8%) estão empregados e dois não responderam. Dos que estão empregados, são 76,7% os que trabalham em empresas privadas, 14,3% os que trabalham por conta própria ou em regime freelancer e apenas 9% têm o Estado como entidade patronal. No que diz respeito a fazer horas extra, a maioria (63%) respondeu afirmativamente._E dos que trabalham horas a mais, 74,2% dizem não ser pagos para tal, sendo que a maioria fica até mais duras horas no trabalho além do horário previsto.

Ainda assim, metade dos inquiridos considera não ter demasiada carga de trabalho, contra 48,6% que se sentem sobrecarregados. No entanto, 55,1% dos que responderam a este estudo não se consideram realizados profissionalmente e apenas 36,2%_diz que estão no emprego no qual sentem ter vocação. Mais de metade dos jovens diz não estar mal no emprego atual, mas que também não se sentem felizes, estando já a pensar no que fazer de seguida.

No que toca a férias, a maioria diz que este ano terá direito a elas e só 14% dos que as pretendem gozar não têm ainda planos. Metade vão optar por férias low cost ou visitas de curta duração ao estrangeiro.