Miguel Relvas já obteve novamente o grau de licenciado, depois de no ano passado o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa ter declarado nula a sua licenciatura. O ex-ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares não recorreu da decisão e optou por fazer agora duas disciplinas para substituir as que a Justiça considerou irregulares. Segundo o SOL apurou, o antigo governante do PSD foi avaliado este mês às cadeiras de Direito Administrativo e de Teoria das Relações Internacionais, tendo obtido 13 e 16 respetivamente, numa escala de 0 a 20.
A Universidade Lusófona tinha recorrido da decisão da Justiça, não tendo havido até ao momento qualquer desfecho, que poderá vir a ser favorável ao antigo governante do executivo de Passos Coelho. Miguel Relvas não quis esperar e realizou assim os exames escritos a 12 e 16 deste mês (segunda época) nas instalações da Lusófona.
Contactado ontem, Alfredo Castanheira Neves, advogado do ex-ministro, disse acreditar que caso a defesa interpusesse um recurso, «inevitavelmente seria reconhecido que tudo tinha sido feito de forma lícita». Defendeu ainda que as duas cadeiras que a juíza de primeira instância considerou faltarem eram de «um plano de estudos que começou já depois de Miguel Relvas ter ingressado». O advogado conclui, afirmando que apesar de ter preparado o recurso, o ex-ministro preferiu não avançar: «Não quis que pairassem dúvidas sobre a regularidade da sua licenciatura e inscreveu-se nas duas disciplinas. Concluiu, num gesto de grande humildade e até, no plano jurídico, contra a minha vontade».
Fonte da instituição explicou ao SOL que uma das disciplinas agora realizadas tem seis ECTS (créditos europeus) e outra quatro, o que, somados aos 170 ECTS que o tribunal tinha considerado terem sido atribuídos regularmente, perfazem o total necessário para a obtenção do grau de licenciado.
A mesma fonte esclareceu também que o ex-aluno terá feito um pedido de reingresso, o que lhe é permitido ao abrigo da portaria 181-D/2015. E o cálculo do número de créditos necessários para a obtenção do grau de licenciatura (10 ECTS) foi definido com base no n.º 1 do artigo 7.º da referida portaria: «O número de créditos a realizar para a atribuição do grau ou diploma não pode ser superior à diferença entre o número de créditos total necessário para a atribuição do grau ou diploma e os créditos da totalidade da formação obtida durante a anterior inscrição no mesmo par instituição/curso ou no par que o antecedeu».
Irregularidades do curso
No verão do ano passado, o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa declarou nula a licenciatura de Miguel Relvas alegando irregularidades nas cadeiras opcionais de Teorias Políticas Contemporâneas I e II. Tudo porque estas eram disciplinas do programa anterior à implementação do Bolonha. Ou seja, que supostamente não poderiam ser frequentadas por alunos que entrassem após a entrada em vigor deste regime.
Em outubro, a Lusófona decidiu recorrer da decisão da juíza Isabel Portela, defendendo que as disciplinas estavam em funcionamento (ainda que fossem do programa anterior a Bolonha) e que, por isso, seria legítimo dar a hipótese de serem frequentadas como cadeiras opcionais das novas licenciaturas.
Na altura, Manuel Damásio, administrador do Grupo Lusófona, disse ao jornal i que «a sentença da senhora juíza merece a […] melhor consideração», confirmando, porém, que a universidade não concordava com ela.
Decisão após dois anos
A sentença chegou mais de dois anos depois de ter dado entrada uma ação administrativa especial intentada pelo Ministério Público contra a Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, e que tinha o ex-ministro como contra interessado.
Após a decisão ter sido tornada pública a defesa de Relvas deixou claro que não iria interpor qualquer recurso. No final do ano passado, em declarações ao mesmo diário, Castanheira Neves, advogado do ex-ministro de Passos Coelho, confirmou essa tese: «O doutor Miguel Relvas não interpôs recurso por não ter cabimento processual recorrer de uma sentença que lhe é quase integralmente favorável. E que apenas aponta um lapso burocrático que não é da sua responsabilidade». Na altura, o advogado acrescentou ainda ter estado «na expectativa do recurso do Ministério Público em virtude de ter soçobrado quase por inteiro a tese que defendeu no processo».
O início do caso
Em 2013, a Procuradoria-Geral da República informou que o Ministério Público no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa tinha decidido intentar uma «ação administrativa especial na qual [peticionava], para além do mais, a declaração de nulidade do ato de atribuição de licenciatura a Miguel Relvas».
Era ainda referido que tal ação tinha sido colocada contra a universidade, mas que tinha Miguel Relvas como contra interessado.
Das 36 disciplinas da licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais, Miguel Relvas só tinha feito avaliação de quatro (as restantes foram por equivalência). O relatório da Inspeção Geral de Educação e Ciência afirmava que, por exemplo, na disciplina de Introdução ao Pensamento Contemporâneo não existia «prova documental de que uma classificação de um aluno não resultou, como devia, da realização de exame de escrito».
No entanto, a juíza Isabel Portela da Costa considerou que neste caso a avaliação atribuída a Miguel Relvas poderia vir a ser corrigida porque não era, entendeu a juíza, inválida, mas padecia de problemas de formalismo. Isto porque o procedimento adotado com Relvas não era «completamente desconhecido» da Lusófona, onde o modo como foi avaliado «se encontra previsto como cumulativo ou alternativo à prova escrita de frequência».
Ainda que a universidade tenha recorrido, há pontos na decisão da magistrada, como a parte relativa à avaliação da Introdução ao Pensamento Contemporâneo, que mereceram a concordância da universidade.