Numa altura em que a polémica em torno da licenciatura de Miguel Relvas parece ter um fim à vista, o reitor da Universidade Lusófona reagiu ao i, dizendo ser “irónico” que no fim deste caso seja, afinal, o ministério de Nuno Crato a ser alvo de uma investigação.
O ex-ministro dos Assuntos Parlamentares, do governo de Passos Coelho, recuperou o grau de licenciado depois de ter realizado, em junho, dois exames – um a Direito Administrativo e outro a Teoria das Relações Internacionais – na Universidade Lusófona que lhe atribuiu 13 e 16 valores (numa escala de zero a 20), respetivamente.
Aproveitando a investigação em curso do Ministério Público sobre alegadas irregularidades em negócios e na entrada do grupo Laureate – dono da Universidade Europeia – Mário Moutinho teceu duras críticas à tutela de Nuno Crato.
“Não deixa de ser irónico que os mesmos que defendiam a credibilidade das instituições de ensino superior não tivessem pensado que isso se aplicava de igual modo ao Ministério da Educação”, sublinha.
As declarações surgem na sequência das suspeitas de alegadas interferências do chefe de gabinete do ex-secretário de estado do Ensino Superior, João Atanásio, que terá aprovado em tempo recorde (13 dias) a passagem do ISLA a universidade, em 2012. Acontece que esta instituição de ensino superior havia pertencido à empresa que tinha como um dos sócios João Atanásio, como noticiou o SOL. E foi esta passagem de estatuto do ISLA para universidade que terá agilizado a compra daquela instituição pelo grupo Laureate, formando, assim, a Universidade Europeia. Hoje, João Atanásio, é professor de Direito e Fiscalidade, precisamente na Universidade Europeia.
O caso está a ser passado a pente fino pelo Ministério Público desde, pelo menos, 2016.
E é “com muita preocupação” que o reitor da Universidade Lusófona diz estar a acompanhar este caso salientado que “a ser verdade” que “favoreceram terceiros no mesmo período temporal que atuavam, ininteligivelmente contra a Lusófona, merece ser esclarecido e retiradas as devidas ilações”.
Mário Moutinho acrescenta ainda que “em Portugal um certo provincianismo faz pensar que tudo o que brilha é ouro. Mas nem sempre é assim e, pelo visto, o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) já percebeu tudo o que está em jogo”.
Sobre o grupo Laureate, dos Estados Unidos da América, o reitor da Lusófona diz que estamos “em presença de um modelo educacional que foi denunciado pelo próprio Senado dos EUA”, referindo o Relatório Tom Harkin 2012. O que, posteriormente, já levou “ao encerramento de centenas de instituições de ensino superior” deste grupo que, segundo acusa, faz “mercantilização da educação”.
Sobre o desfecho ao caso Relvas o reitor da Universidade Lusófona, Mário Moutinho, considera que esta foi a solução “mais adequada, legítima e conciliatória”.
O responsável por uma das maiores instituições de ensino superior privada aproveitou ainda para dar recados e lembrar “tudo o que foi escrito, dito e muitas vezes insinuado”.
Mário Moutinho acredita ser “cada vez mais evidente” que o caso da licenciatura de Relvas foi “dominado” por um jogo de “forças no domínio político e empresarial” não sendo, prevê, possivelmente “o último caso”.
Em 2012 foram várias as notícias publicadas dando conta que o então ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares tinha concluído a licenciatura, em Ciência Política e Relações Internacionais, de três anos em apenas um. Para isso Miguel Relvas realizou exames a apenas quatro disciplinas semestrais, e não frequentou as aulas.
No total, o curso tinha um currículo de 36 disciplinas. Nas restantes 32 cadeiras (90% do total de disciplinas do curso) a Universidade Lusófona deu equivalências a Miguel Relvas pelo seu “currículo profissional muito rico”. Uma das equivalências foi concedida por ser presidente da assembleia geral da Associação de Folclore da Região de Turismo dos Templários, entre 2001 e 2002.
Foi então que o ex-ministro Nuno Crato pediu à Inspeção Geral da Educação que passasse a pente fino o dossier do percurso académico de Relvas. Mais tarde, o relatório da IGEC acabou por confirmar as suspeitas do ex-ministro Crato que, em 2013, o enviou para o MP.
O caso esteve nas mãos da juíza Isabel Portela mais de dois anos e no ano passado, no final de junho, a magistrada decidiu retirar o grau de licenciatura a Miguel Relvas. A Universidade Lusófona tinha recorrido da decisão da Justiça, não tendo havido até ao momento qualquer desfecho. Miguel Relvas não quis esperar e realizou assim os exames escritos a 12 e 16 deste mês.
O i contactou ontem o ex-ministro Nuno Crato, que não teceu qualquer comentário.