São várias as componentes que determinam a cotação de um par cambial como o EURUSD: a balança comercial – que consiste no balanço entre importações e exportações; os fluxos financeiros de compra e venda de ativos; a ação de especuladores – normalmente politizada para além do seu real impacto; e claro, a forma como a política monetária poderá procurar influenciar a sua direção. A zona Euro, com os seus crónicos superávits de balança comercial, tem nessa característica um suporte estrutural para a moeda. Contudo, durante o período de fraqueza relativa entre 2014-2016, as restantes componentes suplantaram esta realidade. Foi nessa altura que o BCE baixou as taxas de juro para valores negativos e iniciou um programa massivo de impressão de moeda, sendo um dos intuitos a depreciação do Euro por forma a evitar o espetro de deflação. Estas políticas, aliadas à incerteza da altura em torno do projeto europeu, incentivaram fluxos para fora da união, traduzindo-se em menos procura por Euros e consequente queda abrupta.
Hoje o cenário é bem diferente. Todos os fatores de fraqueza inverteram-se ao mesmo tempo que o superávit comercial permaneceu robusto. Com a economia em recuperação e uma maior estabilidade política no continente, os fluxos financeiros regressaram aos ativos europeus e o BCE pôde começar a desenhar a retirada de estímulos. Face a esta conjuntura, é irónico relembrar o tempo em que o mundo anglo-saxónico falava de um € mortalmente ferido por via de implosão política na Europa… Este ano o euro acelera face a dólar e libra, com a ineptitude política de Trump e May a ser cada vez mais evidente.
Mas tal como a 3.ª Lei de Newton, também em economia existem várias circunstâncias em que uma ação implica uma reação oposta. O impacto deste movimento cambial atingirá o BCE no seu ponto mais vulnerável, o objetivo de inflação. Uma moeda forte por norma reduz o preço local de produtos importados, tendo um efeito temperador sobre a inflação. As próprias estimativas do BCE apontam para que movimentos desta magnitude tenham um efeito negativo sobre o nível de preços na ordem dos 0,5%. Este impacto é material, especialmente quando notamos que a inflação atual de 1,2% encontra-se bem abaixo do objetivo.
Draghi fica assim com um caminho estreito para percorrer. Se por um lado optar por manter estímulo para contrariar estes ventos cambiais, arrisca a formação de bolhas visto que a maioria dos ativos já se encontra perto de máximos. Se por outro carregar demasiado forte no travão, arrisca falhar redondamente no mandato de inflação. Neste exigente exercício de equilibrismo, torna-se óbvio que o lado fiscal terá de começar a partilhar parte do ónus de reequilibrar a economia europeia.
*Gestor de portfolio multi-activo no BIG – Banco de Investimento Global