Levámos um estreante nas andanças minhotas a conhecer o Gerês. Foram quatro dias de campismo, de trilhos de 20km, verde e mais verde, rios e barragens e, claro, as lagoas, paragem obrigatória para quem quer seguir o roteiro turístico da zona.
Cascata do Taiti, cascata do Arado, cascata das Sete Lagoas e Portela do Homem. Não falhou nada até porque no final queríamos segurança na resposta à pergunta: “De qual gostaste mais?”. Meio a medo, ainda sem saber que iríamos repetir esta reação aos quatro ventos, admitiu que nenhuma conseguiu bater aquela que conheceu numa primeira visita a Ponte da Barca.
Os tempos eram de arraial minhoto, altura em que as noites são longas e os dias não têm horas suficientes para servir de cicerone a uma terra que merece todo o tempo do mundo. Mas lá nos escapamos até à aldeia mais no alto de todas e, como não poderia deixar de ser, tem como nome Ermida.
Do alto dos seus 500 metros face a terra plana, a Ermida mantém os caminhos de pedra com o inevitável rasto que prova que por lá acabou de passar um rebanho ainda a fazer a digestão. Há espigueiros, moinhos de água, fojos de lobo e apenas 45 habitantes que sabem tomar as rédeas da terra. “Houve uma altura em que quiseram fazer uma estrada a sair daqui até Espanha”, conta-nos o dono do único café da aldeia fronteiriça. Mas a população não queria abrir portas a ladrões de gado nem a traficantes de droga. “Não deixámos, ponto final”. E é por isso que o Sr. Carvalhal tem sempre resposta pronta para os turistas que lhe batem à porta a perguntar que caminho seguir. “Está a ver este que subiu? É este que tem que descer”.
E para lá chegar?
Não admira que quem trepe esta aldeia até ao topo precise de parar e ganhar fôlego para um caminho que se prevê igual na descida. A estrada é feita de curva contra curva, onde com alguma ginástica automobilística passam dois carros, ladeados pela segurança de uns raides feitos de madeira. Mas o pior de tudo não é o alcatrão acidentado. O mais difícil é manter os olhos na estrada quando ao nosso lado se monta uma das paisagens mais incríveis que este país tem para oferecer.
O verde toma conta destes montes cuja presença humana mal se nota. Aliás, só não dizemos para deixar o telemóvel em casa porque há imagens que não vai querer que fiquem só pela memória. Aqui não há rede, wifi ou dados móveis, o que quer dizer que o Google Maps é substituído pelo bom e velho seguir das placas.
Nesta estrada existem duas, uma diz “Lagoa 3” e outra “Lagoa 4”, não há como enganar. A 1 e a 2 – a do Eucalipto e de Ponte de Froufe – ficaram para trás, porque o nosso foco está virado para o segredo mais bem guardado desta viagem e para o qual não existe qualquer indicação.
A lagoa que nos faz voltar à Ermida vezes sem fim só é conhecida de quem não se importa de trocar os chinelos por calçado de caminhada. São 15 minutos de terra batida, de sobe e desce mas que no fim valem a pena.
Até podia descrever a cor da água, mas não consigo. Consigo sim, descrever o sabor que fica de cada mergulho. Esses sabem a rio, sabem a infância e sabem a corpo que nem precisa de sabão para se ver limpo.
Entre pedras gigantes e cascatas que vão dando lugar a cada vez mais lagoas, o cenário dá vontade de imitar o genérico da “Pedra sobre Pedra”, que entrou no imaginário de qualquer criança a crescer entre novelas brasileiras dos anos 90. Mas o melhor é voltar aos atuais trinta anos que já nos põem algum travão à imaginação e que nos lembram que não estamos sozinhos. Além de nós, também os fãs de canyoning já descobriram este trajeto, que se torna ideal para quem quer percorrer o rio entre braçadas e escaladas.
Sai-se de lá com a alma cheia e o espaço de memória do telemóvel quase vazio. Mas vai ter que andar alguns quilómetros até voltar a ter a internet necessária para fazer inveja aos seguidores do Instagram. E deixamos aqui um pedido: quando partilhar a foto, deixe a localização em aberto. É a melhor forma de mantermos este cantinho só nosso.