O regresso à infância levou-me estes dias aos pinhais e às vinhas, aos fogos – bem dramáticos – e à escassez da água, à fauna e à flora que nunca esquecemos. E que, num instante, recordamos.
As camélias e as figueiras, as oliveiras e os sobreiros. Não escutei alguns intelectuais que, raivosos e vingativos, emitem opiniões acerca de tudo e de todos. Sei bem que ser intelectual é uma profissão.
Uns seguem – dizem – Platão e Kant. Outros – presumimos – adoram Marx e Hegel. Uns dizem-se estoicos porque sofrem dores de estômago – provenientes, acredito, de digestões abundantes, pois, mesmo não sendo altos, continuam a comer cada vez mais. Outros são cartesianos, porque sentiram a cabeça dorida após dois minutos de intenso raciocínio.
Esta é a moda. E esta moda dos nossos dias é bem prática e muito interesseira. Como se constata, em diferentes níveis, neste tempo pré-autárquico.
Abandonei a minha cidade natal e estas aldeias da minha mimada infância há muitos anos. Gozei a vida e sofri algumas – digo, muitas – dores. Fui homem, sou homem, com defeitos e qualidades como os outros animais da minha espécie. Busco sempre, na roda que me cerca, os exemplos, as comparações, as deduções, tudo quanto me pode ensinar a avaliar quer os homens de outras épocas como, principalmente, entender alguns homens – e mulheres – deste nosso tempo.
E neste nosso tempo há freguesias em que, no próximo dia 1 de outubro, só haverá uma lista a sufrágio. Será lista única. Em que apenas um voto a favor bastará para eleger a respetiva Assembleia de Freguesia. É claro que não é relevante noticiar este facto. Nem importará a alguns intelectuais que, sem contraditório, exercem a sua dita profissão. Cheia de benefícios indiretos. Mas aquele facto – a lista única – expressa com preocupação quer a desertificação de Portugal quer o desinteresse pela política e pela ação política.
Aqui apresento, limpa e lavada, esta notícia. Pouco me importam as teorias de alguns dogmas contemporâneos e não aceito óculos de cor, venham de onde vierem. A riqueza dos aros, nestes espaços singulares, mesmo com algumas pedrarias, não me perturba. Já que a maior riqueza de um homem, mesmo nestas aldeias e vilas em que a todo o momento, e em qualquer lugar, o português já se confunde com o francês, é poder ver a luz do Sol.
Uma luz cada vez menos brilhante com estes fogos que nos atormentam e destroem verdes deslumbrantes.
A verdade da lista única aí está. Quarenta e três anos depois de Abril.
Sei o que senti quando percebi que, perante o desinteresse total pela ação política, escutei que naquela freguesia não haveria competição. Apenas uma lista irá a sufrágio no dia primeiro de outubro. Sei que a freguesia ficará bem entregue. Mas também sei que não será notícia. Não tem gente suficiente para gerar audiências.
O problema é que os homens e as mulheres que a integram são únicos. Na dedicação e na doação. À causa pública. E merecem ser referidos. Não esquecidos. Abraçados, porventura, pelo cidadão Marcelo Rebelo de Sousa. E referenciados, assumo eu, pelo Presidente da República de Portugal!