Quando em 2018 o Titanic II estiver pronto a zarpar do porto da cidade chinesa de Jiangsu, com destino aos Emirados Árabes Unidos, é provável que pela cabeça de um ou outro passageiro se atravesse uma questão: «Será que também este barco tem falta de botes salva-vidas?». Afinal, o milionário australiano Clive Palmer e a sua Blue Star Line prometeram recriar ao pormenor todo e qualquer detalhe do RMS Titanic, o luxuoso paquete que em 1912 se afundou nas águas geladas do Atlântico, a caminho de Nova Iorque, e que levou para o fundo do mar mais de 1500 pessoas.
Não há, evidentemente, motivo para alarme. O novo navio estará perfeitamente equipado com todos os dispositivos de emergência exigidos por lei – incluindo diversas embarcações de salvamento que há mais de 100 anos foram consideradas dispensáveis – e incorporará a mais inovadora tecnologia de ponta, que lhe permitirá navegar em segurança até ao Dubai, na sua viagem inaugural.
Tirando isso, o Titanic II recriará à lupa o ‘unsinkable ship’ (‘navio impossível de afundar’) da White Star Line. Desde a reprodução dos camarotes e áreas comuns de primeira, segunda e terceira classe, passando pela enorme escadaria de acesso ao luxuoso restaurante, à sala de fumo e ao café de estilo parisiense, ou ainda pela piscina, banho turco, sala dos comandos e sala de comunicações – espaços que invadiram a memória coletiva às custas do megapremiado filme de 1997, de James Cameron, com Leonardo DiCaprio e Kate Winslet nos papéis principais – nenhum detalhe do modelo original, no projeto megalómano de Palmer, calculado em mais de 400 milhões de euros, será deixado ao esquecimento.
Do litoral chinês passamos para o interior profundo, onde também ganha corpo uma outra réplica do Titanic. Com um custo previsto inferior ao do Titanic II – cerca de 170 milhões de euros – o The New Titanic, financiado pelo grupo de investimento Qixing Energy, será em todo semelhante ao original e deverá estar pronto em 2019.
Daying, na província chinesa Sichuan, não é Southampton, em Inglaterra – de onde partiu o RSM Titanic antes de embater num iceberg – e por isso fica desde logo colocada de parte a hipótese da imitação poder vir a seguir as pisadas da embarcação original. Isso e o facto de Daying se encontrar a mais de 1000 quilómetros do oceano mais próximo. Ao contrário dos seus irmãos, o New Titanic vai permanecer em terra e assentará no mesmo modelo de negócio que originou a edificação de réplicas de monumentos estrangeiros por toda a China, como a Torre Eiffel (Hangzhou), o Coliseu de Roma (Macau), a Esfinge (Chuzhou) ou a Ponte de Londres (Suzhou). O navio será, na realidade, uma atração turística e a sua construção pretende atrair 10 milhões de turistas por ano.
Tanto o projeto do Titanic II, como o do New Titanic, geraram reações negativas, principalmente junto de familiares das vítimas ou de sobreviventes do naufrágio, que consideram as recriações ofensivas e insensíveis, tendo em conta a brutalidade da tragédia e o impacto que teve junto da opinião pública durante todo o século XX. «Se [o meu pai] soubesse que o Titanic está ser replicado estaria a dar voltas no caixão», lamenta Jean Legg, filha de um sobrevivente do acidente entretanto falecido, em declarações à CBC News.
Críticas à parte, dois novos Titanics estão na calha para cruzar os mares ou aguardar pelos turistas e esperar que o destino não lhes seja também amaldiçoado. Como o foi naquela noite fria entre 14 e 15 de abril de 1912, que colocou no fundo do oceano um dos sonhos mais ambiciosos da mão humana.