Quase uma década e meia depois das reformas Hartz terem criado as condições para a Alemanha se tornar no mais prolífico exportador mundial, eis que Macron avança para a ‘reforma copérnica’ do esclerótico mercado laboral francês. Por cá, espera-se que sirva de inspiração ao governo para que execute algumas medidas realmente reformistas. Se quiserem ideias basta falarem com… Mário Centeno.
A Alemanha do pré 2005 era um país ainda bastante debilitado pela pressão da reunificação. A economia crescia cronicamente abaixo da média europeia e o desemprego teimava nos dois dígitos. O chanceler de então, Schröder, mandatou Peter Hartz para desenvolver um trabalho sobre o mercado laboral com o objetivo de baixar o desemprego. As reformas Hartz foram implementadas entre 2003-2005 e contemplavam várias medidas de flexibilização que, sendo impopulares na altura, vieram a custar a chancelaria a Schröder. O que é certo é que nos anos que se seguiram a Alemanha entrou numa tendência imparável de redução de desemprego, caindo quase ininterruptamente desde os cerca de 12% em 2005 para abaixo de 6%. Os ganhos de competitividade gerados permitiram aos alemães aproveitar da melhor forma a procura vinda da China, tornando-se assim no maior exportador mundial.
Nesta fase o recém eleito Macron depara-se com uma situação semelhante. O desemprego em França encontra-se perto de 10%, com cerca de 25% de desemprego jovem. O mercado laboral francês, à semelhança do português, é altamente dual na medida em que discrimina entre um segmento ultra-protegido e outro, normalmente mais jovem, ultra-desprotegido. A resposta utópica de querer por decreto passar todos os contratos para o segmento ultra-protegido é contraproducente num mundo globalizado onde os países competem entre si por investimento – tal ‘medida’ resultaria em menos captação de investimento e por conseguinte menos possibilidades de criação de emprego. Macron procurou negociar um programa de reformas composto por medidas que pretendem aproximar as negociações da realidade específica das empresas, melhorem a previsibilidade das indemnizações, reduzam burocracia e moldem as características de contratos às necessidades de cada setor, para desta forma dar mais incentivo às empresas a contratarem mais.
O caminho para Portugal poderá rimar com este ímpeto gaulês. O atual ministro das finanças elaborou no passado um detalhado trabalho sobre o mercado laboral. Nesse texto, Centeno aponta na direção de reformas macrónicas, ao propor um «…mecanismo de determinação salarial que permita às empresas negociar as condições salariais diretamente com os seus trabalhadores». e até vai mais longe ao afirmar que: «É necessária uma reforma mais profunda, que reduza os custos de despedimento (monetário e processuais), avance no sentido de uniformizar as diferentes formas contratuais e universalize o seguro de desemprego».
Resta-nos saber se António Costa terá o sentido de Estado para arriscar a sua vida política como fizeram Schröder e Macron, ou se pelo contrário confirma quem o aponta como um oportunista que navega o país à vista. Para tal, poderá precisar de alguém que já se sacrificou no passado, e que agora lidera a oposição.
*Gestor de portfolio multi-activo no BIG – Banco de Investimento Global