O relógio do Brexit não para, já se sabe – Reino Unido e União Europeia têm até março de 2019 para fechar um acordo de saída, ou abandonar Bruxelas de mãos a abanar – mas para lá do Canal da Mancha ainda se discutem as probabilidades de o fatídico evento poder vir ou não vir a acontecer. O último a colocar em causa a exequibilidade do abandono britânico do clube europeu foi o ex-primeiro-ministro Tony Blair que, numa entrevista à Bloomberg, sugeriu que a oposição parlamentar a um hard Brexit pode vir a estragar os planos do governo de Theresa May e está a contribuir para que existam, neste momento, “30% de hipóteses” de o Brexit não vir a acontecer.
“Eu acredito que [a saída do Reino Unido da UE] vai acontecer, mas por outro lado ainda tenho dificuldades em perceber (…) como é que este governo vai levar avante a sua fórmula de Brexit”, começou por dizer o antigo líder trabalhista. “Porque há bastantes deputados do Labour que se opõem [ao Brexit] e há bastantes deputados conservadores que se opõem ao hard Brexit. Por isso (…) há 30% de hipóteses de ocorrer uma mudança e a verdade é que muito dependerá da forma como o debate se desenvolver até ao final do ano”, explicou Blair.
De acordo com o “Daily Express”, e para o caso de alguém poder vir relativizar as previsões do ex-inquilino do número 10 de Downing Street, Blair voltou a sustentar a referida percentagem de insucesso do processo de divórcio entre Londres e Bruxelas, depois de desligadas as câmaras da Bloomberg, na terça-feira à noite.
Citada pelo mesmo jornal, uma fonte do governo torie criticou aqueles remainers – os que votaram pela permanência do Reino Unido na UE, no referendo de junho de 2016 – trabalhistas, “como Tony Blair”, que “parece que ainda não perceberam que o Brexit está mesmo a acontecer”.
Mas as querelas entre políticos e ex-políticos britânicos sobre o tema vão para além das disputas partidárias. O artigo de sábado de Boris Johnson, no “Telegraph”, em que apregoou a sua visão mais radical para o Brexit, fez aumentar os rumores de que estaria preparar-se para apresentar a demissão do cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros, pouco depois do ansiado discurso de amanhã da primeira-ministra, em Florença, mas Johnson rejeitou esse cenário. “Fico confuso com todas estas coisas (…) e honestamente não sei de onde vêm. Tenho a certeza de que ela [May] vai apresentar uma visão entusiasmante e positiva sobre o Brexit e que será um discurso em torno do qual todos nos possamos unir”, garantiu o chefe da diplomacia britânica ao “Guardian”, a partir de Nova Iorque, onde participa nos trabalhos da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Verhofstadt em Belfast
O ex-candidato à presidência da Comissão Europeia e representante do Parlamento Europeu nas negociações rumo ao Brexit esteve ontem em Belfast e mostrou-se favorável à manutenção da Irlanda do Norte no Mercado Único Europeu e na união aduaneira, uma possibilidade que o governo de Theresa May há muito que deixou de parte.
Guy Verhofstadt justificou a posição lembrando que a “ressureição do problema da fronteira” com a República da Irlanda é “consequência da decisão do Reino Unido de abandonar a União” e sugeriu ainda uma hipótese futura de a Irlanda do Norte poder eleger deputados no parlamento de Dublin, garantindo assim a defesa dos seus interesses europeus.