Dez a quinze minutos. Terá sido o tempo de duração da salva de tiros disparada da janela de um hotel de Las Vegas contra as cerca de 22 mil pessoas que na noite de domingo (madrugada de segunda-feira em Portugal) se divertiam num festival de música country, de acordo com quem sobreviveu para contar a história.
O mais recente balanço das autoridades aponta para pelo menos 58 mortos e mais de 515 feridos – cerca de uma dúzia em estado crítico –, números que colocam o terror que se viveu naquela cidade do estado norte-americano do Nevada no topo da lista dos mais mortíferos tiroteios da História moderna dos Estados Unidos, superando o ataque de junho do ano passado na discoteca Pulse, em Orlando (Florida), do qual resultaram 49 mortos.
O “ato de pura maldade”, como descreveu Donald Trump na sua comunicação ao país, esta segunda-feira, foi perpetrado por Stephen Paddock, um norte-americano de 64 anos que decidiu descarregar uma das dez espingardas automáticas que tinha consigo sobre quem assistia ao concerto de Jason Aldean, na popular zona de Las Vegas Strip, a partir da janela do quarto 32º andar do hotel Mandalay Bay, onde estava hospedado desde quinta-feira.
Joseph Lombardo, xerife da Polícia Metropolitana de Las Vegas, informou que tudo parece indicar que o atacante se suicidou pouco tempo antes de a polícia ter irrompido, com explosivos, pelo quarto onde foi levado a cabo o crime, e ainda deu conta da quantidade absurda de armas automáticas que o sujeito possuía. Para além disso, explicou que o nome de Paddock não constava em nenhuma das bases de dados federais: “Não tínhamos qualquer conhecimento sobre este indivíduo”, confessou Lombardo.
O xerife descreveu o atacante como um “lobo solitário” e, numa primeira avaliação, excluiu qualquer ligação com grupos terroristas. Mais tarde veio a defender, no entanto, que na atual fase da investigação ainda “não conseguia colocar-se na mente de um psicopata”, pelo que não estava em condições de avançar com a verdadeira motivação do crime. Não obstante, o grupo Estado Islâmico reivindicou o ataque, através da agência noticiosa Amaq, e argumentou que o seu autor “se converteu ao Islão há uns meses atrás”, apesar de não existir, até ao momento , qualquer indício que ateste a petição da organização jihadista.
Em declarações à CBS, o irmão de Paddock, revelou que a família está totalmente perplexa com o sucedido e garantiu desconhecer os seus motivos. “Ele nem é um tipo ávido por armas. Onde terá arranjado aquelas armas todas? Não tem antecedentes militares, nem nada que se pareça”, lamuriou-se Eric Paddock, que apresenta o familiar como uma pessoa normal, com hábitos relativamente comuns: “[Stephen] não tinha afiliações religiosas, não tinha afiliações políticas… Era apenas um tipo que vivia em Mesquite [a cerca de 130 quilómetros de Las Vegas], conduzia para sul, apostava [e] comia burritos”, descreve.
Pelas redes sociais atropelaram-se ao longo desta segunda-feira centenas de vídeos do incidente, que comprovam o momento de verdadeiro pânico presenciado, em diferentes partes do recinto, por quem estava no local e que, ao som estrepitoso dos disparos de Paddock, procurou abandonar o recinto e agarrar-se à vida.
“Ao início pensei que fosse fogo de artifício a ser disparado, e esperei pelas luzes até ouvir outros disparos. E quando se ouviram uma terceira vez, percebi que algo estava errado. Devem ter sido disparados uns cinquenta tiros, talvez centenas”, contou à CNN Storme Warren, um locutor de uma conhecida rádio country norte-americana que se encontrava entre a assistência. “Quase toda a gente se escondeu em algum lado, debaixo das bancadas ou atrás dos pilares, enquanto outras pessoas gritavam: ‘corram, corram o mais rápido que conseguirem’”, acrescentou uma outra testemunha. “Estão todos a morrer à minha volta. Tenho de sair daqui”, soluçou ao telefone a filha de Jon Cheplak, a partir de Las Vegas.
Donald Trump mostrou-se solidário com as famílias das vítimas, prometeu rezar por elas e garantiu que “o FBI e o Departamento de Segurança Interna estão a trabalhar em conjunto com as autoridades locais para ajudar na investigação”. O presidente dos EUA elogiou e agradeceu ainda velocidade de reação “miraculosa” da polícia de Las Vegas e apelou à união de todos os norte-americanos, num momento difícil para o país. “Em momentos de tragédia e horror, os americanos juntam-se como se fossem um só. Sempre o fizeram”, afiançou.
Barack Obama, Hillary Clinton, Mike Pence, Theresa May ou Justin Trudeau foram algumas das personalidades políticas que recorreram ao Twitter para condenar o ataque e solidarizarem-se com os familiares das vítimas e a adversária de Trump nas últimas eleições presenciais deixou mesmo críticas à National Rifle Association of America (NRA), a maior organização dos EUA em matéria de defesa do controverso direito ao uso e porte de armas no país. “O nosso luto já não é suficiente. Podemos e devemos colocar a política de lado, desafiar a NRA, e trabalhar em conjunto para impedirmos que isto volte a acontecer”, foi uma das mensagens partilhadas por Clinton naquela rede social.
A carnificina de Las Vegas traz à memória outros tiroteios mortíferos bem recentes em solo americano, como em Orlando (2016, 49 mortos), San Bernardino (2015, 14 mortos), Oregon (2015, 10 mortos), Charleston (2015, 9 mortos), Newton (2012, 27 mortos) ou Virginia Tech (2007, 32 mortos).