O processo independentista catalão dá a ideia de uma corrida em que a meta tende a afastar-se. Artur Mas tentou cruzar há três anos um desfecho, que, afinal, se revelou apenas um ensaio, realizando um referendo sem aspirações a lei ou chave de secessão. Seu sucessor, Carles Puidgemont viu-se cruzar outras linhas mais afastadas, primeiro com a criação de uma aliança independentista a quem poucos pareceram dar crédito em Madrid, depois organizando um referendo seu. Esse, sim, prometeu, a sério. E se até domingo a corrida parecia pronta a acabar num referendo falhado à partida, ilegalizado e a toda a oportunidade inutilizado pelas forças espanholas, sem hipótese de se tornar num sufrágio verdadeiramente universal, eis que a meta se desloca outra vez. Agora todos correm para segunda-feira. Esse é o dia em que os independentistas planeiam fazer dos resultados imperfeitos de domingo lei e, possivelmente, declarar independência, o derradeiro gesto de separação do qual ninguém consegue antecipar ao certo as consequências.
Até lá preparam-se as ruas e contam-se as armas. O Tribunal Constitucional de Espanha disparou ontem uma espécie de salva de partida ao suspender preventivamente o hemiciclo catalão de segunda, mesmo antes de este ter sido oficialmente convocado. Trata-se de uma medida, afirma o órgão, de uma “especial transcendência constitucional”. A máxima instância aceitou uma queixa apresentada pelo Partido Socialista Catalão, o braço regional do PSOE, argumentando que, declare-se ou não a independência na segunda – o gesto está ainda no ar –, a sessão será uma afronta constitucional e pode acabar com os direitos dos deputados. Momentos antes, Mariano Rajoy indicou que o seu governo prepara medidas drásticas para responder a uma possível proclamação independentista. “Tem uma solução?”, perguntou a Puidgemont, numa entrevista à Efe. “Sim, e a melhor é o regresso rápido á legalidade e a afirmar com a maior brevidade possível que não haverá uma declaração unilateral de independência, porque só assim se evitarão males maiores.”
Impasse, como sempre Por estes dias, tanto Puidgemont como Rajoy pedem por diálogo a cada ocasião que falam, mesmo que nas ruas os manifestantes se envolvam mais e mais em confrontos – aconteciam de novo ontem ao cair da noite, perto do quartel militar de Sant Boi, em Llobregat. Não faltam candidatos à mediação, e a recém-formada aliança entre as presidentes de Câmara de Barcelona e Madrid dá esperança ao entendimento, mas o mais complicado é concordar nos princípios base. Madrid não aceita negociar um referendo vinculativo e os independentistas não desejam outra coisa. Parece que o impasse está destinado a repetir-se: o governo regional da Catalunha argumenta que a aspiração à independência é legítima, mesmo não estando na lei; as instituições espanholas, por seu lado, respondem que o processo foge à lei e por isso é ilegítimo. Daí que ao início da noite de ontem, quando empresas e bancos pareciam já de malas feitas para abandonar a Catalunha e assim aumentar a pressão sobre os independentistas (ver texto ao lado), a aliança liderada por Puidgemont deixava em aberto realizar na mesma a sessão que o Constitucional suspendeu. “Ainda não decidimos o que vamos fazer”, lançou ontem a presidente do Parlamento da Catalunha, Carme Forcadell.
As ruas, porém, já o sabem. No domingo, cumprindo-se uma semana desde que se realizou o referendo, o dia será dos unionistas, que mobilizaram todas as instituições e partidos contra a independência catalã. Os independentistas, por sua vez, responderam dizendo que vão “esvaziar as ruas” e poupar forças, saindo do caminho e evitando confrontos. “A sua causa é legítima e é normal que se manifestem”, anunciava ontem a Assembleia Nacional Catalã. O seu dia, promete, será a segunda-feira “em que o Parlament se reunirá para declarar a independência”. “Essa segunda-feira exigirá uma mobilização máxima. Estaremos atentos e preparados!”