O discurso desastroso de Theresa May na passada quarta-feira, no encerramento do congresso do Partido Conservador – foi interrompida por um comediante, teve um violento ataque de tosse e viu parte do cenário desfazer-se – não lhe deu outra hipótese senão conceder uma entrevista para apagar a imagem da primeira-ministra e líder partidária frágil e com pouca margem de manobra no que toca às negociações com a União Europeia rumo ao Brexit, e à paciência interna resultante de um ato eleitoral que lhe retirou apoios e credibilidade.
Em declarações ao “Sunday Times”, publicadas este domingo, a líder do executivo britânico confessou que a sua intervenção na cimeira dos tories foi “frustrante” e “desconfortável”, mas garantiu que não se deixou afetar mais do que uma pessoa comum, uma vez que é “bastante resiliente” e “determinada”.
O destaque da entrevista de May vai, no entanto, para a resposta oferecida quando questionada sobre se estaria a pensar em afastar o ministro dos Negócios Estrangeiros, Boris Johnson – acusado internamente de estar minar a liderança da primeira-ministra, com a sua própria visão sobre o caminho para a saída do Reino Unido do clube europeu –, numa remodelação do governo que a imprensa britânica vê como estando para breve.
“O meu estilo nunca foi o de me esconder de um desafio, pelo que não irei mudá-lo agora”, começou por esclarecer May, antes de assegurar que quer sempre os “melhores” ao seu lado, no executivo: “Sou primeira-ministra e faz parte das minhas obrigações garantir que tenho sempre as melhores pessoas no meu governo, de forma a aproveitar ao máximo a riqueza e o talento que estão à minha disposição dentro do Partido [Conservador]”.
Theresa May ainda acrescentou que tem uma equipa “fantástica”, mas o facto de não ter rejeitado, de forma contundente, a hipótese de poder vir a deixar cair o seu chefe da diplomacia, contribuiu para aumentar, ainda mais, o ruído dos rumores, junto da comunicação social britânica, sobre o alegado braço-de-ferro existente entre os dois.
A repercussão da entrevista de May ganhou ainda mais força com as tomadas de posição de outras duas figuras dos Conservadores. Num artigo de opinião no “Daily Mail”, publicado também no domingo, o antigo primeiro-ministro tory John Major, criticou o “comportamento egocêntrico e desleal” de determinados membros do governo e lamentou a “inconveniência” do mesmo. “A sua conduta está a prejudicar o seu próprio partido, a sua própria primeira-ministra e o seu próprio governo. É profundamente inconveniente e tem de parar”, escreveu o ex-inquilino do número 10 de Downing Street.
Já a líder conservador escocesa, Ruth Davidson relembrou, no programa de Andrew Marr, na BBC, que quem serve no governo terá de o fazer conforme “a disposição da primeira-ministra”. “Ele [Jonhson] defendeu que está completamente de acordo com todos pontos finais, vírgulas e palavras do discurso de [May em] Florença [sobre o Brexit]. Gostaria de ver a primeira-ministra prendê-lo a essa posição assumida”, disse Davidson.
O próprio Boris Johnson veio, no entanto, colocar água na fervura. Num texto publicado pelo “Sunday Telegraph”, o antigo mayor de Londres garantiu que não está a forçar “uma eleição que ninguém quer” e catalogou como “loucos” aqueles que querem enfrentar Theresa May internamente.