A juíza da Audiência nacional, Carmen Lamela, concordou com o pedido do Ministério Público espanhol para se avançar com a investigação contra Carles Puigdemont, presidente destituído do governo catalão, e Oriol Junqueras, vice-presidente, pelos crimes de rebelião, sedição e peculato. Carmen Focadell, presidente do parlamento catalão, também é uma das investigadas pelos mesmos crimes. A juíza solicitou aos investigados que estejam presentes nas manhãs de 2 e 3 de novembro, pelas 9h (menos uma em Portugal), nas instalações do tribunal. Caso os investigados não compareçam, o Ministério Público já fez saber que apelará à emissão de mandados de captura e prisão preventiva. Entretanto, e por ordens da juíza, os investigados devem depositar uma garantia de 6,2 milhões de euros nos próximos três dias, caso contrário os seus bens serão apreendidos.
Na conferência de imprensa de ontem em Bruxelas, Puigdemont afirmou que não viajou para a capital europeia para pedir asilo político, ao contrário do que a imprensa internacional tinha sugerido, e defendeu estar disponível para regressar à Catalunha se lhe fossem dadas garantias. “Se um julgamento justo e a separação de poderes puderem ser garantidos, retornaríamos imediatamente”, explicou. “Somos cidadãos europeus que têm liberdade de circulação. Não nos escondemos de nada”, disse Puigdemont.
Antes de a procuradoria-geral espanhola ter anunciado a abertura de processos contra os membros do governo autónomo, o ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol, Alfonso Dastis, admitiu à Sky News que Puigdemont poderia ser preso por ter participado no movimento independentista e que poderia candidatar-se em “teoria” nas próximas eleições regionais “se nessa altura não tiver sido posto na prisão”. As declarações de um dos principais membros do executivo madrileno abriram o debate sobre a separação de poderes entre o executivo e o judicial e na forma como o primeiro tem lidado com Barcelona.
Europa, onde estás? “Uma parte do governo foi a Bruxelas para mostrar o problema catalão no coração da Europa”, explicou Puigdemont. “Peço à Europa que reaja. O caso da Catalunha é o caso dos valores pelos quais a Europa se fundamenta”, apelou aos líderes europeus
A ida de Puigdemont à capital europeia levantou dúvidas sobre se teria ido pedir asilo político ao Estado belga, o único que na Europa o concede a cidadãos europeus, ou se teria ido preparar uma queixa a um tribunal internacional. No final, Puigdemont foi à capital europeia para apelar à mudança de posição da União Europeia e dos líderes europeus, que têm, desde o início do conflito entre Madrid e Barcelona, defendido a Constituição espanhola e a integridade territorial de Espanha.
“Esta segunda-feira, depois da declaração de independência, assumimos que o diálogo era impossível”, disse Puigdemont. “O PP e o PSOE têm um problema gigante que não querem assumir politicamente”. Para os líderes catalães destituídos, o confronto com Madrid é “político e não judicial e, portanto, a solução encontrada tem de ser política”. O catalão referia-se aos processos judiciais abertos pela procuradoria-geral espanhola contra os membros do governo e da mesa do parlamento.
Puigdemont acusou Madrid de apenas “conhecer a razão da força” e de “o caos ter começado a 1 de outubro com a violência da polícia espanhola”. “A queixa confirma a extrema agressividade do governo [espanhol] contra o governo e a mesa do parlamento [catalães], que não é legalmente apoiada”, rematou. E reafirmou mais uma vez ser o “presidente legítimo”, não se coibindo de alertar para o “grave défice democrático que existe hoje no Estado espanhol”. Para reforçar a sua legitimidade democrática e o facto de não ter abdicado do seu mandato, Puigdemont anunciou que “o governo legítimo da Catalunha dará prioridade a quatros eixos de trabalho”. No primeiro concentrar-se-á em “evidenciar o problema catalão no coração da Europa”, tentando ganhar apoios para a causa independentista e para refrear as ações do governo de direita de Mariano Rajoy.
No segundo, alguns membros do governo catalão “continuarão na Catalunha para realizarem atividade política como membros legítimos”, em mais uma reafirmação de que o executivo destituído não abandonará o cargo para o qual foi eleito com um “programa eleitoral” que “defendia que no final desta legislatura seria proclamada a independência”.
Em terceiro lugar, o governo catalão “apoiará as diferentes iniciativas para evitar a demolição do sistema institucional catalão com a aplicação do artigo 155”, tendo, ainda, apelado à desobediência pacífica dos sindicatos, partidos e organizações civis catalãs. Em último lugar, o governo catalão encara as eleições [do próximo dia 21 de dezembro] como um desafio democrático. Os desafios democráticos não nos assustam”, afirmou. Contudo, deixou mais um alerta a Madrid: “Respeitaremos o resultado das eleições de 21 de dezembro, como sempre fizemos, seja qual for o resultado. O Estado espanhol fará o mesmo? Quero um compromisso claro”.