Jantar sensorial. Comer num aquário e ao som da tempestade

Há três anos que o Alquimia, restaurante do Epic Sana, escolhe um dia para contar uma história através da comida. Este ano, dia 3 de novembro, a Lenda de Atlântida é contada em forma de mesa de aquário, olhos vendados, sons de tempestade, ostras, lavagante e percebes   

Ainda cá fora a apreciar um fim de tarde algarvio ao sabor de um flute de champanhe, é-nos lançado o primeiro desafio. Só entra para o jantar quem souber dizer o nome da filha de Atlas. Quem o diz é um senhor vestido de deus grego e, como tal, é para levar a sério.

Ninguém tem a resposta pronta e todos tentam discretamente espreitar a abençoada Wikipédia inerente a qualquer smartphone. O mais audaz arrisca um “Atlântida” em voz alta, que serve de senha para a entrada em mais um jantar sensorial, que o restaurante Alquimia organiza anualmente pela mão do chefe Luís Mourão. 

Quem não conseguiu conter a curiosidade e acabou a espreitar o que aconteceu nas edições anteriores sabe que tudo é possível, desde comer algemado até intercalar refeições com danças no varão. Afinal, vale tudo para estimular os sentidos e fugir apenas ao palato quando o assunto é comida.

O jantar está servido A primeira bandeja – chamemos-lhe assim – é servida em forma de mulher pintada de branco, deitada numa mesa e envolvida em trufas que podem ser de azeitona, presunto, cogumelos ou salmão. Por fora parecem todas pequenas bolas douradas, por isso a surpresa acontece sempre na boca.

Finalmente vislumbramos a mesa onde todos nos sentamos de uma forma ordenada, porquê ainda não sabemos, mas terá uma razão já que tudo aqui é pensado ao milímetro. O olhar divide-se entre o bizarro de ter o tampo da mesa preso por cordas e cadeados e a curiosidade em experimentar o ouriço do mar servido com ovo e caviar. Matamos primeiro a curiosidade e só depois experimentamos as diferentes chaves que cada um tinha em mãos. Cadeados abertos, chegou a hora de vendar os olhos e esperar por mais uma surpresa.

Só que esta não era só mais uma surpresa, foi ‘o’ momento da noite. Já com os olhos abertos, percebemos que a mesa que achávamos servir apenas para pousar os pratos, sem o tampo de madeira, transformara-se afinal em aquário, com direito a peixes, ouriços, algas e rochas. A partir de agora este passa a ser o cenário de todo o jantar que está dividido em nove momentos. Haja estômago!

Mas as doses são pequenas, como se quer, até porque têm que ficar equilibradas em pequenas rochas de maneira a não dar de comer aos peixes. E o próximo prato é digno de esforço, para que não se perca nem uma única migalha. O polvo quase que desfaz de tão tenro e o tempero de cebola e ervas dá o toque que se torna perfeito quando a acompanhar está um Quinta de Saes Reserva Branco.

A partir daqui, a delicadeza muda para a “Guerra”, tema do quinto capítulo desta história, servida ao som de Puff Daddy e Pink Floyd e com travessas em chamas. Todo o staff, vestido com artefactos gregos, grita enquanto serve uma espetada feita de carabineiro, lula e moleja panada – um dos poucos toques de carne da refeição – acompanhada de uma líchia em forma de olho humano. E como no amor e na guerra vale tudo, engolimos tudo para voltar a ter os olhos vendados.

Sem ver, a música adequa-se ao tema “Tempestade”, enquanto somos pulverizados com água. Temia-se o pior, mas assim que temos ordem para tirar a venda, à nossa frente está apenas um lavagante, como se a palavra lavagante pudesse alguma vez ser precedida da expressão ‘apenas’.

Como proposta seguinte, uma vieira que esteve quase desde o início do jantar escondida dentro de um frasco submerso e que se junta a um risoto de ervilha.

Fim aos salgados, venham os doces. O primeiro – bolo de vinho branco, merengue e maçã verde – é servido numa base de esferovite para que possa flutuar na mesa-aquário. Depois, toda uma obra de arte feita num prato, onde uma máscara feita de chocolate tapa um mix feito de também de chocolate, a que se junta o amendoim, limão e pêra.

Sobrevivemos a tudo, este ano sem algemas nem strips, mas com direito a dizer que já comemos num aquário. Não é para todos. [mas é para aqueles que reservarem mesa para dia 3 de novembro através do email info.algarve@epicsanahotels.com e estiverem dispostos a experimentar um jantar sensorial por 150 euros]

 

Os pratos e a música que os acompanha

1.Filha de Atlas

•  Azeitona verde, presunto pata negra, cogumelos, salmão

Ennio Morricone- The Ecstasy os Gold

 

2. A ilha

•  Ouriço-do-mar, yuzo, caviar

Astor Piazzola – Vuelvo al sur

 

3. Descoberta

•  Ostra, mexilhão, camarão, perceves

Ramin Djawadi- Light of the Seven

 

4. Atenas

•  Polvo, cebola defumada, ervas

Life of Pi Soundtrack – Skinny Vegetarian Boy

 

5. Guerra

•  Carabineiro, moleja, lula, líchia

Puff Daddy – Come With MePink Floyd – The Dogs of War

 

6. Tempestade

•  Lavagante bisque, gnocchi de batata-doce

Rainstorm Sounds

Air – La Femme D’Argent

 

7. Mundo Submerso

•  Vieira, risoto de ervilha

Michael Kiwanuka – Cold Little Heart

Agnes Obel – September Song

 

8. Busca da cidade perdida

•  Maçã verde, merengue, bolo de vinho branco

Atlantis the Lost Empire – Tour of Atlantis

Atlantis the Lost Empire- Atlantis Destroyed

 

9. Mito

•  Chocolate, amendoim, imão, pêra

Stranger Things Soundtrack- Kids

Max Richter – On the Nature of Daylight