Foi a pergunta do dia, ontem, nos corredores de Westminster. Como foi Gavin Williamson parar a ministro da Defesa? O deputado conservador de 41 anos, eleito para a Câmara dos Comuns em 2010, sucede a Sir Michael Fallon, que se demitiu esta semana por alegado assédio sexual. O governo de Theresa May, já algo fragilizado, perdeu o ministro e remodelou em 24 horas.
Gavin Williamson, que substitui Fallon na pasta da Defesa britânica, era chief whip – um cargo que em Portugal seria a fusão entre um secretário-geral de partido e um líder de grupo parlamentar, mais nos bastidores da bancada – há cerca de um ano. Traduzindo literalmente, um chief whip é o homem do chicote nas votações. O trabalho de Williamson era manter a disciplina entre os tories e ganhou especial relevância depois de Theresa May perder a maioria absoluta, sendo obrigada a um acordo (similar às posições conjuntas entre a esquerda portuguesa) com o Partido Unionista da Irlanda do Norte. Exagerando no paralelo, Williamson foi para May o que Pedro Nuno Santos é para António Costa: um braço-direito supostamente discreto, cada vez mais evidente.
O Castelo de cartas desmoronou A ironia da sucessão a Fallon tem que ver com o facto de os whips dos partidos com assento parlamentar estarem sob suspeita de guardarem informações sensíveis – como as que levaram à demissão de Michael Fallon – acerca dos seus deputados, de modo a manterem a referida disciplina. Dito de outro modo: a intimidade usada como chicote.
Gavin Williamson será, ao mesmo tempo, a causa e a consequência da saída do ministro da Defesa, ficando–lhe com o lugar. Com algum humor, o diretor do “Huffington Post” no Reino Unido, Paul Waugh, escreveu que a comparação entre o novo ministro e Frank Underwood – a polémica personagem de Kevin Spacey na série televisiva “House of Cards” – era “óbvia” e que, depois da igualmente polémica nomeação, está “convencido de que Theresa May nunca viu” um episódio. Na ficção, Underwood sobe ao poder exatamente como Gavin Williamson alegadamente subiu: à custa de segredos alheios. Num discurso no último congresso dos conservadores, assumiu utilizar a tática do “pau e da cenoura”, não preferindo o pau, mas antes uma “cenoura afiada”.
Escutando a mais recente intervenção de Lisa Nandy, do Partido Trabalhista, nas questões à primeira-ministra, o humor tende a desvanecer. “Há três anos, trouxe-lhe provas de que os whips [como Williamson] estavam a usar informação sobre abusos sexuais para garantirem a lealdade dos seus deputados”, recordou Nandy, em reação à saída de Michael Fallon, que não negou o comportamento impróprio e “abaixo do exigido às Forças Armadas” que tutelava. A primeira-ministra May incentivou todos os chief whips a denunciarem qualquer caso de abuso às autoridades policiais.
Tarântulas no gabinete Independentemente disso, Gavin Williamson é o novo ministro da Defesa britânico. Criou uma nova página oficial nas redes sociais – tropeçou na patente, assinando primeiro como secretário de Estado e depois como ministro – e já provocou reações menos positivas no grupo parlamentar, que não gostou de ver a mesma pessoa que aconselhou May a pedir a demissão de Fallon furtar-lhe a posição. A ausência de qualquer experiência executiva ou militar e a idade jovem para a política têm sido outras das farpas apontadas a Williamson. O excesso de ambição quando Whitehall tem falta de renovação geracional é olhado com receio. O novo ministro foi educado numa família trabalhista e votou contra o Brexit no referendo: duas ligações a um eleitorado com que o gabinete de Theresa May tem sentido dificuldades.
O facto de Gavin Williamson manter uma tarântula de estimação no seu gabinete não tem feito parte das críticas, mas o exotismo pode ver-se, sob vários ângulos, no seu Instagram. Diria Huxley que é o admirável mundo novo. Frank Underwood sorriria de orgulho.