Estávamos nos anos 90 quando irrompe na cena musical uma personagem fácil de fixar ao primeiro relance: lentes de contacto que lhe punham os olhos desiguais e da cor de gelo, pele pintada de branco, a simular um cadáver, lábios escuros de sangue e roupas góticas. A persona completava-se com atuações difíceis de adjetivar e onde tudo aconteceu, desde serrar uma vaca em palco na Índia – acabou expulso do país –, esmagar pintainhos com botas de pregos, cuspir no público e até defecar em palco. Marilyn Manson, nascido Brian Hugh Warner, era apenas um dos muitos que, embora com décadas de separação com o culto de Charles Manson, foi buscar para o nome artístico o apelido do homem que ficou conhecido como um dos mais perigosos – e loucos – do século xx.
Charles Manson, músico falhado, assassino condenado, inspirou incontáveis criações artísticas, por mais bizarro que isso possa soar. A propósito da sua morte, o “Guardian” escreveu que, ainda hoje, permanece “um fascínio mórbido” em volta do pai da família Manson.
Não é, contudo, pioneiro neste fenómeno. Jack, o Estripador, já virou lenda, mas foi homem. A cada geração continua uma busca pelo esmiuçar dos crimes e pelo próprio assassino que aterrorizou Londres no final do séc. xix. Nos últimos 130 anos surgiram séries, documentários, filmes e crónicas que povoam – ou ajudam – o imaginário coletivo sobremos crimes do Estripador.
Desde que Charles Manson, com o seu grupo de 12 seguidores, matou de forma bárbara a atriz Sharon Tate – mulher de Roman Polanksi – e foi considerado o responsável pela morte de mais seis pessoas que começou uma espécie de euforia criativa em torno desta barbárie.
Além das investigações jornalísticas que viraram livro, há uma série de produções inspiradas nos crimes daquele verão de 1969. Só filmes e documentários já são dezenas. Logo em 1973, foi lançado um filme/documentário dirigido por Robert Hendrickson e Laurence Merrick que foi indicado nesse ano para o Óscar de melhor documentário de longa-metragem.
Seguir-se-iam “Helter Skelter” (1976), de Tom Gries, baseado no livro escrito pelo procurador que dirigiu a investigação, Vincent Bugliosi, e pelo escritor Curt Gentry; “Manson Family Movies” (1984) ou “The Six Degrees of Helter Skelter” (2008). A lista estende--se e vai continuar a alargar. Este ano, Quentin Tarantino anunciou que o tema do seu próximo filme será Charles Manson e a revista “Variety” já publicou até uma lista de 12 atores que poderão desempenhar o papel, na qual constam, por exemplo, os nomes de Christian Bale, Jared Leto, Joaquin Phoenix ou Kit Harington. Mas também foram feitos musicais: “Charles Manson: Summer of Hate – O Musical” esteve em cena no Thalia Theatre, em Hamburgo.
Na música a presença de Manson não passou despercebida. Antes de ser preso cruzou-se com Dennis Wilson, dos Beach Boys, para quem terá escrito uma letra. Depois editou dois discos já na prisão. Os Guns N’ Roses gravaram em 1993 uma versão de “Look At Your Game, Girl”, uma música composta pelo próprio Charles Manson. Um ano antes, já os Nine Inch Nails tinham rodado o teledisco de “Gave Up” na casa onde Sharon Tate fora assassinada. Os Kasabian também foram buscar o nome a Linda Kasabian, uma das seguidoras do culto que acabou por testemunhar contra Manson. Por cá, também por essa altura (1991), os Mão Morta apareceram com um tema intitulado “Charles Manson”.
As referências multiplicam-se e chegam ao universo das artes visuais, e até Bansky pintou a sua versão do assassino – entretanto removida – perto da estação do metro de Archway, em Londres. O génio do mal seduz, dizia um sabedor. Mariana Madrinha