Nada debilitou a liderança de Oposição de Pedro Passos Coelho como António Costa e a sua adoção das prioridades do Governo anterior. A partir do momento em que Costa e o PS tomaram a eliminação do défice, a redução da dívida e as exportações como bandeiras – quando haviam feito campanha pelo «consumo interno» e troçado da «obsessão com o défice» –, Passos ficou sem as bandeiras que eram antes suas. Essa estratégia, de converter «a austeridade» em «responsabilidade», de berrar contra «os falcões de Berlim» (Ferro Rodrigues, 2015) para proto-presidir o Eurogrupo (Centeno, 2017), foi perfeita na anulação do PSD enquanto maior partido da Oposição. Como esta coluna vem insistindo, um partido não pode fazer oposição a si próprio. Passos não conseguiu ser líder da Oposição porque não quis cair no populismo de opôr-se ao que defendera enquanto primeiro-ministro – e terá sempre o meu respeito por isso.
Agora que Passos sai, António Costa terá um problema naquilo que mimetizar do seu antecessor. Uma coisa é ser Passos enquanto este está – e ainda cimenta a ‘geringonça’ – outra é sê-lo depois de Passos sair. Esta semana, Costa mostrou-o, ao dizer que a ideia orçamental de «tudo para todos» corresponde a «uma ilusão», que «Portugal não pode sacrificar tudo o que conseguiu do ponto de vista da estabilidade financeira», que um «princípio fundamental» do seu Governo é «a consolidação das finanças públicas» e, em jeito de apogeu da referida mimética, que «não podemos consumir todos os recursos disponíveis com quem trabalha no Estado». Passos Coelho não diria melhor, não é verdade, meu caro leitor? Um fantástico déjà vu! Os sindicatos não tardaram a ameaçar o Governo socialista com o Tribunal Constitucional, o que me leva, sinceramente, a admitir que esta é uma nostalgia mais saudável que a esperada. Prefiro que Costa seja líder de um Executivo similar ao de Passos na responsabilidade que semelhante ao de Sócrates nas loucuras. Trata-se, afinal, de uma questão de auto-preservação nacional.
A esquizofrenia de um primeiro-ministro que vendia Portugal na Web Summit como «um ótimo sítio para investir, com a burocracia domada, estabilidade económica e um ecossistema próspero» e ouvia, na mesma semana, um seu ministro descrever o país como «velho, pobre e em muitas circunstâncias entregue a si próprio» acabou. António Costa foi de «virar a página da austeridade» para dizer que «dar tudo a todos» é uma ilusão, o que deixa uma pergunta aos partidos que o apoiam.
Enxovalharam Passos Coelho, que teve a hombridade de avisar que o dinheiro não dava para tudo; insultaram-no, atacaram-no, acusaram-no de «racismo» e de ser contra o seu país. E hoje patrocinam o Governo de alguém que prometeu o oposto e acabou a dizer exatamente o mesmo? Que não há dinheiro para tudo?
O deputado João Galamba responde que tudo isto não passam de «mentiras».
Pois é, meu caro leitor. Eu também me desmanchei a rir.