Theresa May tem finalmente razões para sorrir, depois de uma semana que até prometia ser calma, mas que, por culpa da irredutibilidade demonstrada pelos unionistas norte-irlandeses – que apoiam o Governo minoritário tory – em aceitar um regime regulatório para a Irlanda do Norte distinto do resto do Reino Unido, acabou por se transformar numa verdadeira corrida de contra-relógio, desde segunda-feira. Na madrugada desta sexta, a primeira-ministra britânica e Jean-Claude Juncker alcançaram finalmente um compromisso e o presidente da Comissão Europeia decidiu recomendar aos Estados-membros da União Europeia que as negociações do Brexit progridam para a próxima fase – a das relações futuras entre as duas entidades.
Embora tenha referido que «ainda há muito trabalho a fazer», o Partido Democrático Unionista mostrou-se convencido com as novas propostas de May para assegurar que não haverá uma fronteira física entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda, e garantir, ao mesmo tempo, a «integridade constitucional e económica» do Reino Unido, sem «barreiras regulatórias» e sem «restrições de acesso» ao mercado interno britânico. «Não queremos uma linha vermelha no Mar da Irlanda», reforçou a líder do partido, Arlene Foster, citada pela BBC.
Juncker deu igualmente luz verde ao plano de May para a ilha irlandesa, tal como o fez para os outros dois temas quentes da primeira fase de negociações: os direitos dos cidadãos comunitários a residir no Reino Unido e os dos britânicos domiciliados noutros Estados-membros da UE; e a fatura a pagar por Londres para formalizar o divórcio.
No anúncio do acordo, em Bruxelas, a primeira-ministra garantiu, em relação ao primeiro tópico, que os direitos adquiridos pelos europeus residentes em solo britânico serão «consagrados na legislação britânica e assegurados nos tribunais britânicos». O compromisso com a Comissão estabelece ainda que o Tribunal Europeu de Justiça continuará a supervisionar a garantia destes direitos, incluindo os dos expatriados britânicos, durante os primeiros oitos anos após o abandono do Reino Unido do clube europeu – marcado para o final de março de 2019.
Relativamente ao preço que os britânicos terão de pagar para abandonar a União, Theresa May não apontou números, mas garantiu que será uma quantia «justa para os contribuintes britânicos» e que possibilitará um investimento futuro em «habitação, escolas e no NHS [o serviço nacional de saúde do Reino Unido]». A imprensa britânica sugere, no entanto, que o montante andará algures entre as 35 e as 40 mil milhões de libras esterlinas – 40 a 46 mil milhões de euros –, números que, a confirmarem-se, serão inferiores aos sugeridos ao longo dos últimos meses – 50 ou 60 mil milhões de libras.
Através de um comunicado divulgado na manhã desta sexta-feira, a Comissão Europeia revelou-se «satisfeita com os progressos suficientes alcançados nas três áreas prioritárias» [fronteira; direitos; e fatura] e destacou o compromisso feito pelos (ainda) 28 Estados-membros em «honrar as obrigações da ‘lei do Brexit’». Citado pelo Politico, o seu presidente, Juncker, também se congratulou com o «acordo justo» alcançado numa «negociação difícil», ao passo que Michel Barnier, negociador-chefe da UE, salientou a possibilidade de se poder agora «discutir o relacionamento futuro numa base de confiança e segurança».
A proposta britânica será agora apresentada ao Conselho Europeu, marcado para quinta-feira da próxima semana, onde os chefes de Governo dos restantes 27 Estados comunitários decidirão pela aprovação ou rejeição da mesma. Caso seja autorizado o avanço das negociações para a segunda fase, Londres e Bruxelas terão cerca de um ano para chegar a acordo sobre os termos do relacionamento entre o Reino Unido e o bloco comunitário no pós-Brexit.