O PCP e o tenente japonês

Camaradas: os latifundiários, os banqueiros e os capitalistas são espécies extintas. Foi o PCP que as extinguiu

O Partido Comunista faz recordar a história do tenente japonês Hiroo Onoda, sempre que toma posições que obrigam a questionar se, naquele grupo parlamentar, alguém saberá que a Segunda Guerra Mundial acabou em 1945, o Muro de Berlim caiu em 1989 e a URSS já não existe. 

É assim, quer quando juram que a Coreia do Norte é uma democracia, como quando assumem irredutivelmente posição contra um voto de pesar da Assembleia da República pelo falecimento do líder de um grupo empresarial que criou 50.000 postos de trabalho. 

Anos e anos de treino para negar as evidências dá nisto: uma cegueira incurável.

Quem, em 1974, lia jornais e via televisão, ainda conserva na retina a imagem das caras graníticas de um Comité Central onde Álvaro Cunhal aparecia ladeado por gente a quem nunca se via um sorriso. 

Jaime Serra, Carlos Costa, Aboim Inglês, Dias Lourenço e outros duros davam credibilidade ao carimbo que um sectarismo de sinal contrário colou aos comunistas: ‘gente capaz de comer criancinhas ao pequeno-almoço’. 

As ‘pessoas normais’ que o PCP levou para a Constituinte – capazes de conviver com os seus pares com tolerância democrática – sentiram-se asfixiadas pelo ambiente de chumbo e, paulatinamente, foram abandonando as hostes. 

Os ortodoxos resistiram nas suas barricadas, e os que restam fazem hoje um esforço colossal para mostrarem um ar que não assuste, quando as câmaras de televisão apontam ao grupo parlamentar. É verdade que Jerónimo de Sousa adoçou – quem o viu e quem o vê… – mas sem conseguir disfarçar as marcas que, anos e anos a representar o papel de duro dos metalúrgicos, lhe deixaram no rosto.

Nos últimos tempos, o PCP lá conseguiu arregimentar para o grupo parlamentar uns quantos rostos jovens, que também dão jeito para mandar aos debates televisivos, e juntou Os Verdes, para ajudarem a compor um discurso adocicado para os amigos do ambiente, mas não chega! 

Vem a Coreia do Norte… pimba! Vem a Venezuela… borra a pintura! Depois, alguns desses jovens acham por bem retomar tiques do velho fanatismo, e mostram que a encenação dos sorrisos e das boas maneiras é só para as televisões e para as campanhas eleitorais. 

Camaradas: ‘abaixo os latifundiários, os banqueiros e os capitalistas… já não cola! São espécies extintas, foi o ‘partido’ que as extinguiu! 

O povo que vota não imagina o que seja ‘capital’, quanto mais ‘capitalistas’. Na era da net, para o povo, ‘capital’ é o dinheiro vivo, são as notas que saem das ATM. Quanto a ‘capitalistas’, acha que são todos estrangeiros: os chineses, angolanos e brasileiros que compraram os bancos, as seguradoras, a EDP, a REN, a Cimpor, a TAP e tudo quanto mexia.

Camaradas, vejam se entendem: em 1944, o tenente Onoda internou-se na selva filipina para combater os americanos, e por lá continuou, alheio às notícias de que a guerra tinha acabado. Esteve 30 anos fora do mundo. Mas, em 1974, acordou para a realidade e voltou para a civilização. Consta que viveu feliz até aos 91 anos.