Os mais conservadores defendem que as meninas deverão continuar a usar cor-de-rosa e a brincar com bonecas e os meninos a vestir azul e a brincar com carrinhos; enquanto os mais liberais defendem que essa diferenciação já não faz sentido e que se deve respeitar a vontade da criança independentemente dos estereótipos.
Se fizermos uma resenha histórica do conceito e entendimento do ser misterioso e encantador que é a criança, percebemos que ele foi sempre condicionado pelo olhar e os receios dos adultos e da sociedade. Inicialmente as crianças eram vistas e tratadas como adultos em miniatura e por isso como seres incompletos. Só no século XVIII, principalmente com Rousseau, a criança começou a ser vista na sua singularidade. A diferença de género foi camuflada por vestidos e longos cabelos para evitar a curiosidade dos mais pequenos acerca da sexualidade e só mais tarde começou a fazer-se uma distinção clara. Os meninos começaram a ter um corte de cabelo mais curto e a usar calções e a vestir principalmente… cor-de-rosa! Por ser uma cor mais forte, enquanto o azul, por ser mais delicado, era destinado às meninas.
Com o evoluir dos tempos tem sido dada cada vez mais atenção à criança, aos seus direitos – muitas vezes mais do que às suas obrigações – e interesses. Foi nesse sentido e pelo facto de meninos e meninas brincarem cada vez mais juntos e partilharem brinquedos que se começou a verificar que os meninos por vezes também gostam de brincar com brinquedos de menina e vice-versa. No fundo, a escolha do brinquedo está ligada não só à personalidade, gostos e vivências de cada um, mas também à vontade de exploração de outras realidades através das brincadeiras. Um bom exemplo disso é o facto de por vezes os maiores rufias da escola, num contexto protegido e de confiança de psicoterapia, escolherem as casinhas e loicinhas para vivenciar emoções e relações importantes para si. Quanto mais abrangentes forem as escolhas, maior a liberdade de pensamento e desenvolvimento de capacidades.
Mas não devemos cair no fundamentalismo. Continua a ser verdade que há diferenças, mesmo ao nível do cérebro, e uma maior tendência das meninas, que são mais emocionais e ligadas à linguagem, para brincar com bonecas e dos meninos, que são mais ligados a questões visuais, muito físicos e amigos da velocidade, para gostar de empilhar, jogar à bola e brincar com carrinhos.
Já ouvi mães e tias dizerem que vão dar o mundo da Barbie a certo menino porque ele gosta de brincar com as da irmã e que preferem isso a que brinque com pistolas. É a isto que chamam abertura de espírito? Ou será antes mais uma forma de condicionamento pelos mais velhos, camuflada de liberalismo?