A Comissão Europeia resolveu passar das palavras aos atos. Depois de em julho deste ano ter sugerido que iria iniciar os procedimentos necessários para acionar o artigo 7.º do Tratado de Lisboa contra a Polónia, como resultado da deriva autoritária seguida pelo governo ultranacionalista do Partido da Lei e Justiça (PiS), o organismo supranacional europeu oficializou essa intenção, num gesto sem precedentes no clube comunitária.
Conhecido em Bruxelas como o “botão nuclear da UE”, o artigo 7.º pode ser invocado pelos Estados-membros para punir um outro Estado que esteja a violar gravemente os princípios basilares da organização. Dessa invocação pode resultar a aplicação de uma sanção para o “infrator”, mediante uma votação decidida por unanimidade. No caso mais grave, aquele pode ver-se privado do seu direito de voto no Conselho Europeu.
A decisão foi adotada ontem de manhã pelos comissários europeus e justificada pela insistência do governo polaco, agora liderado por Mateusz Morawiecki, em avançar para uma reforma na justiça do país que coloca o poder judicial sob alçada do poder político e viola grosseiramente o princípio da separação de poderes preconizado pela União Europeia. O pacote legislativo, recentemente aprovado pelo parlamento em Varsóvia, estabelece que passa a ser o executivo a controlar a nomeação e o afastamento dos juízes do Supremo Tribunal e das instâncias inferiores, e oferece à assembleia legislativa o poder de escolha dos membros do órgão responsável pela indicação de todos os juízes a nível nacional.
“Quem põe fim à separação de poderes, está a violar o Estado de Direito e este é uma condição necessária [para se pertencer à UE]. Não se aplica apenas à Polónia, mas a toda a UE, no seu conjunto”, explicou em conferência de imprensa o vice-presidente da Comissão, Frans Timmermans, citado pelo “El País”.
O apoio declarado de Budapeste à causa polaca, no entanto, dificilmente permitirá a aprovação de sanções à Polónia por parte dos chefes de governo dos restantes Estados-membros, no âmbito do artigo 7.º. O vice-presidente da Hungria, Zsolt Semjén, já garantiu que “não há hipótese de o executivo húngaro aceitar” este procedimento, que entende como uma “intromissão” de Bruxelas nos assuntos internos da Polónia. Na mesma linha, o primeiro-ministro Viktor Orbán rejeitou castigar Varsóvia e rotulou a recomendação da comissão de “ofensiva inquisitória contra a Polónia”.
Zbigniew Ziobro, ministro da Justiça polaco, entende a pretensão de Bruxelas como uma forma de “penalizar” Varsóvia pela rejeição do sistema de distribuição de refugiados por quotas – aprovado pelos Estados-membros – e rejeita as acusações de violação do princípio da separação de poderes. “[Esta decisão] é sobre política e não sobre o Estado de Direito.
Para além de recomendar a invocação do artigo 7.º, a Comissão Europeia decidiu ainda levar a reforma judicial polaca ao Tribunal de Justiça da UE, que tratará de atestar a sua legalidade.