Benfica debaixo de fogo desde abril

Francisco J. Marques está há oito meses a mostrar, em direto, emails confidenciais dos encarnados.

As acusações de Francisco J. Marques ao Benfica, através da sua participação no programa Universo Porto, começaram em abril, com o diretor de comunicação do FC Porto a divulgar emails trocados entre Luciano Gonçalves, presidente da Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF), e responsáveis encarnados, onde o primeiro pedia bilhetes para um jogo noEstádio da Luz a um preço mais baixo. Luciano Gonçalves reagiu rapidamente, explicando ter agido na condição de Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Centro Recreativo de Alcanadas.

Daí para cá, todas as terças-feiras à noite o diretor de comunicação do FC Porto faz novas ‘revelações’ de emails alegadamente trocados entre responsáveis do Benfica, com o presidente Luís Filipe Vieira à cabeça, e elementos ligados aos mais diversos setores organizativos do futebol português, com destaque para a arbitragem. Durante largas semanas, o denominador comum foi Adão Mendes, que passou quase anónimo pelo principal escalão da arbitragem nacional no início dos anos 90 mas que depois foi observador de árbitros e integrou o Conselho de Arbitragem da AF Braga.

Um dos seus interlocutores primordiais era Pedro Guerra, durante vários anos diretor de conteúdos da BTV, o canal televisivo do Benfica, e que acabou por ganhar mediatismo pela participação nos programas de comentário desportivo televisivo, primeiro na CMTV e depois na TVI24. Frases como «Algo está a mudar, o Porto já não manda», «Hoje quem nos prejudicar sabe que é punido» ou «Vamos ter os padres que escolhemos e ordenamos, nas missas que celebramos. Temos é de rezar e cantar bem. AGORA APAGUE TUDO», alegadamente ditas por Adão Mendes a Pedro Guerra, rapidamente se tornaram virais e indignaram os amantes de futebol – com especial destaque, claro está, para os adeptos doFC Porto e do Sporting, os clubes que se sentiram diretamente lesados com as vitórias do Benfica desde 2013.

Acusações de parte a parte

No seguimento destes primeiras emails divulgados, o Benfica avançou com um processo-crime contra Francisco J. Marques, considerando «um absurdo» a acusação do diretor de comunicação do FC Porto. Entretanto, o Ministério Público abriu um inquérito para investigar o caso, na sequência de uma denúncia anónima que deu entrada no Departamento Central de Investigação e Ação Penal a 8 de junho, encaminhando o mesmo para a Comissão de Instrutores da Liga.

Desde logo, a Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ pediu ao FC Porto «toda a documentação» que tinha em sua posse, e desde o início o Benfica se mostrou disponível para colaborar com a Justiça e fornecer toda a documentação necessária. Ao mesmo tempo, sempre se insurgiu contra a divulgação da correspondência eletrónica por parte dos dragões, acusando o clube portista de crimes de violação de correspondência e de manchar o nome e a reputação do clube.

Na passada semana, de resto, foi divulgada na internet uma página com um arquivo que contém cerca de 6 gigabytes de emails enviados por Pedro Guerra entre maio de 2010 e março de 2017. Os autores da mesma revelaram ainda centenas de emails e passwords de dirigentes e funcionários do Benfica, que entretanto prometeu agir judicialmente contra os mesmos. As águias já tinham interposto várias providências cautelares junto dos tribunais para tentar impedir a divulgação das referidas informações, considerando que estas ações configuram um ataque «não apenas ao clube mas também ao Estado de Direito Democrático», mas nenhuma das tentativas teve provimento pela Justiça. Em julho, por exemplo, o Tribunal Judicial da Comarca do Porto considerou que «algumas das afirmações, a ser comprovada a sua veracidade, revestem manifesto interesse público, a despeito da forma como às vezes são transmitidas» e realçou que o impedimento à divulgação das mesmas poderia ser visto como «hipotética censura a um meio de comunicação social», dado que Francisco J. Marques tem divulgado os emails no Porto Canal. Essa é, de resto, a posição do diretor de comunicação do FC Porto desde o início: sempre afastou o cenário de ilegalidade escudando-se no «interesse público» do conteúdo dos emails.

Em outubro, alegando a existência de «indícios de corrupção ativa e passiva por parte de um indivíduo», a Polícia Judiciária (PJ) efetuou buscas no Estádio da Luz e em casa de vários elementos encarnados, com Paulo Gonçalves a ser constituído arguido – o estatuto de advogado assim o obriga, quando alvo de buscas. Então, o Benfica, por intermédio do advogado João Correia, regozijou-se pela visita da PJ, garantindo desejar que tal acontecesse já desde o início de todo este processo.

Um mês depois, um dos membros do Conselho Fiscal da FPF, Horário Piriquito, demitiu-se do cargo na sequência de uma notícia da revista Sábado que dava conta da troca de emails com informação confidencial do funcionário da FPF com Pedro Guerra, seu amigo e antigo colega no jornal Independente. Não terá sido, de todo, a última vítima deste processo que ainda fará correr muita tinta.