Conto de fadas de Ciudadanos e de Inés Arrimadas

A história de Inés Arrimadas, a jovem mulher de 36 anos que levou pela primeira vez um partido espanholista a ser o mais votado numas eleições catalães, expressa bem as contradições e as divisões que se vivem em Espanha. 

Conto de fadas de Ciudadanos e de Inés Arrimadas

Durante a campanha eleitoral, esta mulher que chegou há dez anos à Catalunha ficou envolvida numa polémica sobre a sua família. Vários sites afirmaram que a candidata tinha como primo um antigo governador de província franquista e dirigente da Falange, e que o seu pai tinha sido polícia político franquista.

Confirma-se que o primo da jovem candidata foi de facto dirigente da ditadura. Moisés Arrimadas Esteban (ver artigo na Wikipédia) foi delegado provincial do Ministério da Habitação em Cádiz, nos anos 60, e ascendeu posteriormente a governador das províncias de Cuenca e Albacete e foi chefe local da Falange. Durante o seu mandato deu-se a morte do ditador Francisco Franco e teve a responsabilidade de organizar na região, as homenagens ao falecido. A democracia levou-o a mudar para Albacete onde voltou à administração pública.

Os serviços da candidatura do Ciudadanos, no entanto, desmentiram as afirmações sobre o pai da candidata ter sido polícia em Barcelona; não chegou a ser, porque decidiu frequentar o curso de Direito, e acrescentaram que a candidata tinha também um avô comunista, que lutara pela República na Guerra Civil. 

A carreira política desta mulher – filha de um casal de Salamanca, nascida em Jerez de La Frontera, na Andaluzia, exercendo consultadoria profissionalmente – que garante não querer estar na política muito tempo, está intimamente ligada ao aparecimento de Ciudadanos. «Há dias que penso quando voltarei a uma empresa privada. Não estou há mais de três anos na política, é verdade. A única coisa que penso às vezes é na minha profissão: consultoria. Eu tenho uma característica de ser muito racional. Sei que a política não é, nem deve ser, uma profissão», declarou há uns anos numa entrevista ao El País. 

Durante seis anos trabalhou como consultora de operações e estratégia da empresa D’Aleph, com sede em Barcelona, devido a isso passou, entre 2006 e 2008, a viver na cidade. Em 2010, assistiu com uma amiga a uma sessão do recém formado Ciudadanos-Partido da Cidadania e no ano seguinte inscreveu-se, como aposta do líder Albert Rivera para porta-voz para a juventude. Quando era jovem havia sido simpatizante do PP, o partido em que os seus pais sempre votaram até a filha ser dirigente do Ciudadanos. 

A 30 de julho de 2016, depois de já ter encabeçado a lista do Ciudadanos para o parlamento catalão, Arrimadas casa com Xavier Cima, ex-deputado da Convergência Democrática de Catalunha, parte independentista da Convergência e União, que se transformou no PDeCAT de Puigdemont. O marido abandona, posteriormente, a carreira política por causa da mulher. 

O Ciudadanos nasce em 2006, como reação direta ao chamado ‘Pacto de Tinell’, em que socialistas (então com a presidência da generalitat), comunistas e independentistas de esquerda, ERC, se comprometiam a reformar o Estatuto da Catalunha, de modo a que ficasse claro a necessidade de um processo de construção nacional. Esse acordo foi visto como traição por parte de alguns intelectuais de esquerda que viram esse compromisso como o aceitar por parte da então liderança do PSC da agenda dos nacionalistas. A proposta de criar um novo partido para se opor a isso, foi assumida, em julho de 2005, com a publicação do ‘Manifesto do Taxidermista’, nome do restaurante em que os promotores se costumavam reunir. Assinavam o manifesto nomes como o escritor Félix Azua, Albert Bordellas, Francesc Carreras, entre outros. Criou-se uma plataforma digital a que aderiram 2305 pessoas, 330 de fora da Catalunha. A 8 e 9 de julho de 2006 realizou-se o primeiro congresso do Ciudadanos. Os 350 delegados não tinham um líder claro, e foi assim que resolveram escolher arrumar a lista da direção por ordem alfabética. É por este acaso que Albert Rivera, nascido em 1979, antigo militante do PP, aliciado para a iniciativa pelo seu professor Francesc de Carreras, acaba presidente. Um partido que é unido pelo anticatalanismo, constituído pela iniciativa de intelectuais desiludidos pelos socialistas acaba dirigido por gente que vem do PP. Na primeira vez que concorreram ao parlamento da Catalunha, 2006, obtiveram 89 840 votos e três lugares de deputado, numa lista encabeçada por Rivera. Muito longe dos 37 lugares e 1 102 099 votos que Arrimadas conseguiu a  21 de dezembro.