Carolina Panthers. Mais do que um clube

Pode comprar-se um clube de futebol americano como afirmação política e de identidade dos negros americanos? Sean ‘Diddy Combs’, o multimilionário do hip hop, acha que sim e Stephen Curry, a estrela de basquetebol dos Golden State Warriors, concorda. 

Os Carolina Panthers nunca ganharam o Superbowl. Estiveram próximos em 2003, quando foram derrotados pelos New England Patriots, e em 2015, vencidos pelos Denver Broncos. Em breve poderão transformar-se em algo mais do que um clube de futebol americano que disputa a NFL (National Football League) desde 1995 e estender mesmo o raio da sua área de captação de adeptos para além dos limites de Charlotte e da Carolina do Norte, onde está sediado.

Se Sean Combs – aliás Diddy, aliás Puff Daddy, aliás Puffy, aliás P. Diddy, ou, mais recentemente, Love – concretizar a sua vontade de adquirir uma participação maioritária nos Panthers para o transformar numa referência para o movimento negro americano e símbolo do “black lives matter”, a equipa de Charlotte será o baluarte de uma nova identidade política no futebol americano.

Diddy tem dinheiro para isso. Há anos que lidera consecutivamente a tabela dos homens mais ricos do hip hop norte-americano. Na última das listas publicadas pela Forbes, a sua riqueza estava avaliada em 820 milhões de dólares. Falta agora saber se irá mesmo concretizar o seu velho sonho de adquirir uma equipa de futebol americano ou, como outras bazófias tonitruantes do mundo do rap e do hip hop, se fica pelas palavras não concretizadas.

Desta vez, pelo menos, Combs parece ter arregimentado para a causa o basquetebolista Stephen Curry, uma das maiores estrelas do basquetebol americano da atualidade (dois títulos da NBA e duas vezes jogador mais valioso), que assinou este ano um fabuloso contrato de 201 milhões de dólares a cinco anos que o transformou no jogador mais bem pago da história da NBA. Curry respondeu ao tweet de Diddy que dizia «eu gostaria de comprar os @Panthers. Espalhem a palavra. Retweetem!» com um «eu quero entrar!». Curry cresceu em Charlotte e é adepto entusiasta dos Panthers.

Quem também está muito interessado na causa é Colin Kaepernick, o quaterback que começou o movimento de protesto na NFL ao colocar um joelho no chão na altura antes dos jogos em que toca o hino nacional. O atleta está desempregado desde a rescisão do contrato com os San Francisco 49ers, em março. «Vamos fazer isso acontecer!», disse.

Para Sean Combs, o projeto de adquirir uma equipa da NFL como forma de afirmação política em defesa dos negros («Não há na NFL proprietários negros com a maioria do capital. Vamos fazer história!») tem de incluir Kaepernick. «Imediatamente tratarei da questão Colin Kaepernick e vou contratá-lo para quaterback titular da próxima época», disse num vídeo no Instagram.

O curioso é que esta história é desatada por uma questão de racismo. O atual proprietário da franquia dos Panthers, Jerry Richardson, resolveu colocar a sua participação maioritária na equipa à venda depois de ter sido acusado de assédio sexual no trabalho e de insultar com um comentário racista um dos observadores da equipa.

«Acredito que chegou a altura de entregar a franquia a outro proprietário», afirmou Richardson numa declaração à imprensa. «Assim sendo, vou pôr a equipa à venda no fim da época da NFL», acrescentou. De acordo com a Forbes, os Panthers estão avaliados em 2,3 mil milhões de dólares e Richardson tem 48% da franquia, logo, para concretizar o negócio, Diddy vai precisar de juntar dinheiro suficiente para fazer uma proposta que se aproxime de 1,1 milhões de dólares. Muito mais do que toda a fortuna do cantor, mas este também não pensa em avançar para a compra sozinho.

O curioso é que ainda há pouco tempo Diddy, também no Twitter, confirmando o sonho longevo de ser dono de uma equipa, sublinhava que o mesmo tinha evoluído, agora queria ser proprietário de toda a liga de futebol americano. «Eu tinha o sonho de ser dono de uma equipa da NFL, mas agora o meu sonho é ser dono da nossa própria liga! Uma liga em que podes ser tu próprio. Ter um plano de reforma.» E acrescentava: «Ter liberdade para ser um grande [ser] humano e protestar pelo teu povo sem seres demonizado pelas tuas crenças».

Colin Kaepernick agachou-se. Soava o hino no estádio e o quarterback dos San Francisco 49ers, enquanto todos os outros se punham de pé, baixava a cabeça e assentava o joelho no chão, em protesto contra a injustiça racial nos EUA. Muitos imitaram o gesto, não só no futebol americano, também no basquetebol. O Presidente Donald Trump reclamou, pediu aos donos dos clubes que despedissem aqueles que não respeitam o The Star Spangled Banner; muitos mais responderam dobrando o joelho, outros ficaram nos balneários. 

A mimetização do gesto, a participação no protesto simbólico contra uma sociedade que continua a estigmatizar os negros e a matá-los por motivos fúteis e em grande número, a partilha do hashtag #blacklivesmatter não ajudam, no entanto, Kaepernick, que continua desde março sem emprego e já apresentou queixa contra os proprietários da NFL, acusando-os de conluio para não o contratar.

Na terça-feira, na sua página do Twitter, onde quase tudo se tem passado, Diddy colocou um pequeno vídeo de uma pantera com a pergunta: «O que representa a liberdade para ti?» Para ele, pelos vistos, representa comprar os Carolina Panthers. E, dizemos nós, transformá-lo em mais do que um clube, usando a frase com que o Barcelona se define.