Conflitos. Trump & Co. aumentam risco de uma guerra global

As alterações ambientais são o risco mais plausível e um dos mais destrutivos, mas o mundo está mais instável e pronto para a guerra

O súbito eclodir de uma devastadora guerra entre as principais potências no mundo não se encontra entre os acontecimentos mais prováveis do próximo ano, de acordo com a lista de ameaças globais que o Fórum Económico Mundial publicou ontem. Não é o evento mais provável, é verdade, mas é mais provável do que em qualquer outro momento das “últimas décadas”, segundo se lê na análise realizada por centenas de políticos e especialistas, que todos os anos desfiam os cenários mais negros que se podem abater sobre o planeta.

E se é verdade que uma guerra nuclear e de armas de destruição maciça é tão provável este ano como a explosão de um surto infeccioso severo, capaz de provocar o pânico e a ruína nos mercados, também é verdade que o espetro de um conflito armado de grande escala é de longe o risco mais destruidor. Se a possibilidade de uma nova peste se encontra no décimo lugar dos acontecimentos possivelmente mais desastrosos, um conflito armado global encontra-se isolado no primeiro posto, à frente de fenómenos meteorológicos extremos, outros desastres naturais, de um voltar das costas às alterações do clima e de uma crise mundial de escassez de água e comida. 

Não há nisto muitas surpresas. Afinal de contas, num mundo em que o presidente norte-americano confronta aberta e insultuosamente o já incendiário presidente norte-coreano e num momento em que o arsenal atómico do seu país parece ser capaz de atingir os Estados Unidos, dá indícios de incluir bombas de hidrogénio e camiões de disparo de engenhos já abastecidos, não é de espantar que o risco de um conflito nuclear tenha aumentado.

No entanto, o documento do Fórum Económico Mundial sustenta que os riscos de um confronto armado global estão ligados à probabilidade também maior de conflitos regionais e mundiais. Nesta avaliação, Donald Trump e as políticas de identidade que contribuíram para a sua eleição são incontornáveis. Segundo o documento publicado ontem: “A política do homem forte e carismático alastra-se”. Somando-se à plataforma “A América em Primeiro” do presidente Trump, podemos encontrar variações deste mesmo tema em vários países, desde a China ao Japão, passando pela Rússia, Turquia, Arábia Saudita, Filipinas e outros lugares. A tendência para o exercício personalizado do poder acontece num contexto de crescente volatilidade geopolítica.”

O fantasma nuclear A volatilidade e as políticas isolacionistas tendem a replicar-se. O Fórum alerta para o facto de as mesmas organizações globais criadas depois da Segunda Guerra Mundial para mitigar o risco de um novo conflito se terem tornado agora um inimigo consensual das políticas do isolamento e do “cada um por si” – o discurso deTrump na última Assembleia Geral das Nações Unidas defendeu precisamente essa postura nacionalista. Apesar disso, e enquanto as bombas nucleares, os ataques químicos e as grandes explosões mobilizam a imaginação coletiva, o Fórum afirma que os mais plausíveis e devastadores riscos são, por grande vantagem e pelo segundo ano consecutivo, os associados a alterações climáticas: “Dos 30 riscos globais que os especialistas avaliaram em termos de probabilidade e impacto, os cinco riscos ambientais – condições meteorológicas extremas, perda da biodiversidade e o colapso de ecossistemas – encontram-se entre as duas principais preocupações.”

No Pentágono da administração de Trump, todavia, pensa-se o contrário. Segundo a imprensa americana, as Forças Armadas estão prestes a apresentar ao presidente uma proposta de reforma das políticas de uso de armas nucleares dos Estados Unidos com a qual pretendem alargar as ameaças às quais o governo pode responder com bombas atómicas. A proposta, que ainda não foi revista pelo presidente mas está a ser analisada pelo seu governo, defende que o arsenal nuclear americano pode ser usado em retaliação a ataques que provoquem danos desastrosos a estruturas vitais como as que podem ser causadas por um vasto ataque cibernético contra as redes de comunicação ou energia.

Esta é a primeira vez que a ameaça de guerra cibernética é concebida como uma provocação de proporções nucleares, embora o documento sustente que há outras respostas viáveis para ataques desse género. Os generais sublinham também, que Washington deve ter em conta as ambições nucleares e nacionalistas da China, Rússia, Coreia do Norte e, possivelmente, Irão. “Temos de encarar a realidade como ela é e não como gostaríamos que fosse”, sustenta o documento.