Orlando Figueira admitiu esta manhã pela primeira vez que pode ter cometido erros numa das investigações a Manuel Vicente que acabou arquivada. A alteração da sua posição – até aqui disse sempre que os seus despachos eram “tecnicamente irrepreensíveis” – surgiu quando foi confrontado pela procuradora Leonor Machado com um despacho de um outro procurador do Departamento Central de Investigação e Ação Penal onde punha em causa os procedimentos de Orlando Figueira no processo relativo à compra de 24% das ações do BES Angola por parte da sociedade Portmill.
Em causa está o processo 149, que nasceu com base numa participação da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, onde eram referidas várias personalidades angolanas. Incluindo, refere o MP, Manuel Vicente.
O inquérito visava perceber como é que em 2009, a Portmill tinha comprado as ações e se haveria algum crime de branqueamento do montante envolvido – 375 milhões de euros. Nomeadamente se isso envolveria ou não Ricardo Salgado, uma vez que o dinheiro foi pago ao BES.
Orlando Figueira enviou uma carta rogatória para Angola para obter informações sobre essa sociedade, mas acabou por não receber resposta. Algo que não inviabilizou o arquivamento.
O coletivo questionou nesta quarta sessão de julgamento do caso Fizz o arguido sobre o porquê de isso ter acontecido, dado que no momento em que enviou a carta rogatória considerou serem importantes para a investigação.
O antigo procurador do DCIAP justificou porém que achou não ser fundamental a resposta, lembrando até que foram juntos outros documentos ao processo que esclareceram as dúvidas.
A procuradora Leonor Machado disse que no processo 149, após ter sido referido que era importante investigar Manuel Vicente, o nome do antigo vice-presidente de Angola foi retirado da Carta Rogatória enviada a Angola.
Orlando Figueira, no entanto, assegura que a investigação não o visava e que o projeto de Carta Rogatória que exclui o nome de Vicente foi inclusivamente da responsabilidade da PJ. O que importa, diz Orlando, era saber a estrutura acionista da Portmill e não se sabia de nomes específicos, pelo que, continuou, ainda não estava a investigar Vicente quando apalavrou o contrato de trabalho com Carlos Silva.
Explicou Orlando Figueira que a rogatória foi enviada diretamente ao PGR de Angola ao abrigo de um protocolo, não de forma convencional, mas que está tudo registado: “Nada foi feito por baixo da mesa”.
A reabertura do processo 149
O proecesso arquivado por Orlando Figueira acabou, porém, por ser reaberto. E a argumentação do arguido de que voltou a ser arquivado não colheu. A procuradora Leonor Machado lembrou que no despacho de reabertura do novo procurador, Paulo Gonçalves, é referido que Orlando Figueira não fez o “follow the money”, ou seja o rasto do dinheiro, e outras diligências, nomeadamente porque por trás da Portmill estariam diversos elementos da elite angolana, havendo referências até a Manuel Vicente.
Nesse momento, Orlando Figueira admitiu: “Posso ter errado, poderia ter feito o follow the money”.
O antigo magistrado afirmou que, ainda assim, isso não alterou o final, uma vez que o novo inquérito acabou por ser outra vez arquivado.
Com a postura que assumiu desde que começou o julgamento, Orlando Figueira desafiou a procuradora e o MP: “Reabra-se agora o inquérito para saber de quem é a Portmill”.
O outro inquérito arquivado, relativo à compra de apartamentos no Estoril Sol, também envolvendo a Portmill, foi igualmente passado a pente fino na sessão de hoje, com o MP a questionar os procedimentos seguidos.
Orlando Figueira justificou que arquivou esse inquérito depois obter dados suficientes, como as declarações rendimentos de Manuel Vicente, os antecedentes criminais, e se existiam ou não processos crime a visá-lo. Após isso, mandou retirar todos os documentos comprovativos de rendimentos do ex-vice-presidente e devolveu-os à defesa para evitar que os jornalistas os pudessem consultar.
Esta opção foi questionada pelo juiz presidente do coletivo, Alfredo Costa.