“Houve um conjunto de momentos, digamos, que nos tocaram a todos em termos de pressão”, começou por contar Paulo Blanco, ontem de manhã, durante o julgamento do caso Fizz, que está a decorrer desde a semana passada no Campus da Justiça, em Lisboa. O advogado confessou que ele, Carlos Alexandre e Cândida Almeida foram pressionados quando estava em curso a investigação à megafraude contra o Tesouro angolano, que visava algumas personalidades daquele país.
No caso Fizz, o procurador Orlando Figueira responde em tribunal por alegadamente ter sido corrompido pelo ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente, sendo Paulo Blanco, advogado que representava o Estado angolano em diversos processos, descrito na acusação como um intermediário. Ontem tentou mostrar o porquê de ter uma relação tão próxima com magistrados do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), procurando demonstrar que tudo não passava de contactos relativos a questões de trabalho.
Na sua defesa, o advogado confessou que Cândida Almeida, então diretora do DCIAP, terá mesmo admitido que estava a ser pressionada. E Paulo Blanco confessou que ele mesmo também foi vítima dessas ameaças: “A própria placa do meu escritório foi arrancada, telefonavam–me a meio da noite e até vim a dar nota à Polícia Judiciária.”
Segundo o arguido, as pressões e ameaças foram o motivo para a aproximação e relação de confiança entre os três. “Havia um espírito de união, na medida em que o Estado de Angola era assistente, existia uma ligação profissional”, disse, completando: “O contexto profissional aproximou-nos na medida em que eu era advogado do assistente” e isso “levou ao estabelecimento de relações de confiança.”
Nas suas declarações, Paulo Blanco lembrou ainda que o processo que gerou as ameaças era “de tal forma complexo e grande que foi dividido em sete” partes. Uma dessas partes chegou a Orlando Figueira que, na altura, era procurador no DCIAP.
O advogado, ao longo do julgamento, analisou a acusação ponto por ponto. Num deles afirmou nunca ter conhecido Manuel Vicente e que a primeira vez que teve contacto com Armindo Pires (homem de confiança do ex-governante angolano) foi em 2011, quando este contactou o seu escritório através de um email. Blanco reforçou ainda perante o coletivo de juízes que até à data não “sabia que viria a ser advogado do procurador de Manuel Vicente”.
Durante o julgamento, o advogado voltou a garantir que não foi ele quem convidou Orlando Figueira e o procurador Vítor Magalhães a viajar para Luanda, no âmbito da Semana da Legalidade, apesar de os vistos terem sido pagos pelo seu escritório. “Cândida ligou-me a dizer que havia um problema com os vistos, ninguém quereria ir a Angola se tivesse de pagar os vistos. O meu escritório adiantou o dinheiro e fomos reembolsados pela República de Angola”, explicou.
O encontro entre Orlando Figueira e Carlos Silva, no Hotel Trópico, em Luanda, também foi tema de conversa. O advogado referiu que os dois se encontraram num contexto mais social. “Estávamos todos hospedados no mesmo hotel. Nesse dia, eu tinha combinado beber um café com o dr. Carlos Silva e bati à porta de Orlando Figueira e disse-lhe, ‘olhe, vou descer, se quiser vir, nós vamos ali beber café’”, explicou, acrescentando que não se tratou de uma reunião e que era habitual avisarem quando saíam dos quartos.
Uma das novidades foi ter referido que no encontro apareceu Maria Luísa Perdigão Abrantes, presidente da agência do investimento estrangeiro de Angola.
Pressionado pelos juízes a responder sobre se houve ou não proposta de emprego a Orlando Figueira nesse encontro e quem propôs a quem, Blanco afirmou que “efetivamente houve conversa, parte a parte, de trabalhar em Angola”. No entanto, não esclareceu quem convidou quem, defendendo-se com uma analogia: “Quem convidou para dançar, eu não sei, mas que estavam a dançar, estavam.”