Não deixa de ser excêntrico que os dois rostos de maior potencial político no arco-de-governação pertençam ao seu partido mais pequeno: o CDS. Nos últimos dois anos, Assunção Cristas e Francisco Rodrigues dos Santos ascenderam em dimensões e velocidades distintas mas notáveis. A presidente do CDS-PP e o presidente da Juventude Popular (a ‘jota’ dos centristas) já são duas figuras incontornáveis para o centro-direita.
Até agora em funções diferentes – Cristas ultrapassou o PSD em Lisboa, quase triplicando o resultado de Portas; Rodrigues foi distinguido na imprensa internacional e não será exagerado dizer que também ultrapassou a concorrência social-democrata –, é certo que a sua associação tem mais interesse naquilo que os separa (bastante) do que naquilo que os une (o partido).
Ambos formados em Direito, Rodrigues fez o percurso na JP até à liderança, enquanto Cristas entrou como independente e tem reduzida ligação à estrutura partidária. Ele prima pela ideologia, ela é uma pragmática. Ele recusa dizer «centro-direita», preferindo mesmo assumir-se «de direita»; ela dispensa tanto falar numa coisa como noutra. Ele foi o único político português que não de esquerda a criticar Wolfgang Schäuble – e eu cheguei a agradecer-lhe isso –, ela é uma europeísta convicta, como aqueles que já governaram costumam ser.
Já acho, no entanto, que a notoriedade de Rodrigues dos Santos extravasa a tradição mais irreverente da JP quando comparada ao CDS, sendo novamente curioso que o seu «social-conservadorismo» tenha algo em comum com o Partido Social Democrata e com o Centro Democrático Social enquanto forças políticas: a palavrinha «social» está lá. O que revela, afinal, que o pragmatismo não está assim tão longe.
Apesar de me parecer que a esquerda ainda viver em Abril não obriga a direita a continuar com a cabeça em Novembro, talvez haja mesmo um eleitorado católico e tradicionalista para disputar – e talvez esse eleitorado esteja demasiadamente esquecido. Mas não posso deixar de recordar àqueles que, como eu, apreciam ler as crónicas do ex-diretor d’O Independente, em que este pedia um CDS mais «radical» e sem medo «de ser de direita», que esse jornalista foi o mesmo homem que em 2015 ganhou eleições acusando o programa do PS de «neoliberalismo» e dizendo que «aqui ou somos sociais-democratas ou democratas-cristãos».
Eventualmente, a primeira batalha é essa. Afirmar que os «centristas» já não estão ao centro e que os «sociais-democratas» já não têm de defender a social-democracia. Depois, se o partido que tem centro no nome não conseguir conquistar a direita, haverá naturalmente um partido de direita a querer conquistar o centro. Cristas, até agora, tem a coisa mais importante em política: resultados. Rodrigues, aos 29 anos, tem a segunda coisa mais importante em política: tempo.
No PSD, por exemplo, Sá Carneiro faz sentido para alguma militância, mas já não faz sentido para todo o eleitor. Quando em excesso, a mitificação tende a resultar numa redução da condição presente. Isto é: a nostalgia que serve partidos de nicho não chega para partidos que queiram governar. Para isso, é preciso futuro. E tanto Cristas, hoje, como Rodrigues dos Santos, um dia, têm uma proposta de futuro para os portugueses. São é propostas diferentes. Bem diferentes.
Um bom dilema para o CDS-PP.