«Não falta amor. Falta amar»

Esta afirmação veicula uma mensagem muito verdadeira e foi captada, em Lisboa, na Travessa do Carvalho (mas, entretanto, já foi apagada). Posteriormente, encontrei esta afirmação também grafitada no Porto e, recentemente, foi ainda fotografada pela minha amiga Gila, em Belém.

Realmente, se pensarmos bem, «não falta amor», o que falta efetivamente é «amar». Falta a capacidade de amar pessoas concretas e de lhes demonstrar que efetivamente as amamos. Como diz Coimbra de Matos: «se não se amar não se vive».

E o amor não precisa de ser um amor físico; pode ser o amor por um amigo ou por um animal de estimação. Como escreveu António Gedeão: «É necessário amar, / qualquer coisa, ou alguém; / o que interessa é gostar / não importa de quem. / (…) / Pode ser uma mulher, / uma pedra, uma flor, / uma coisa qualquer, / seja lá o que for».

O ser humano tem uma capacidade infinita de amar, de dar o seu afeto aos outros e de o repartir ou, antes, de o multiplicar por várias pessoas – pelos filhos, pelos pais, pelos amigos verdadeiros, pelas pessoas que, de alguma forma, nos tocam, pelo cachorrinho que adotámos ou pelo gato que herdámos do filho que, entretanto, emigrou, por necessidade ou por vontade íntima de descobrir o mundo.

Como disse Benjamim Disraeli, escritor e primeiro-ministro britânico: «Todos nascemos por amor. É o princípio da existência e o seu fim último.» Curiosamente, também Josh Tillman, que canta sob o nome de Father John Misty, em entrevista a propósito do seu novo álbum, afirma que «a única forma de sobrevivermos enquanto humanos é amando-nos uns aos outros».

É muito recorrente esta afirmação da necessidade de amor e de amar para garantirmos uma existência humana. Tal como precisamos de sentir o amor dos outros, também precisamos de amar e de lhes dar os nossos melhores sentimentos para nos sentirmos verdadeiramente vivos. Assim como temos necessidade de sentir que vivemos dentro dos outros, também necessitamos de sentir os outros vivos dentro de nós. Se não formos nós próprios capazes de amar, estamos a secar no nosso íntimo a chama que nos faz sentir vivos. Se não sentirmos – medo, angústia, amor, raiva, amizade, alegria… – não estaremos a interiorizar, e muito menos a exteriorizar, o que o mundo em nós desperta.

E, assim, é muito difícil conseguirmos ser felizes. Que tal, então, tomarmos a decisão consciente de sermos felizes e de tornarmos os nossos filhos (ou sobrinhos) felizes, num mundo onde as crianças já não brincam na rua e preferem brinquedos eletrónicos?

 

Maria Eugénia Leitão

Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services