Capitólio. O voto na democracia cultural

Recebeu teatro de revista, cinema porno e serviu de discoteca. Após três décadas de jejum, o Capitólio reabre portas e, nos próximos cinco anos, está a cargo da Sons em Trânsito. A diversidade programática é a aposta da promotora

Trinta anos após ter fechado portas, e dez após um processo de requalificação, o agora Cineteatro Capitólio – Teatro Raul Solnado oficializa a relação com o novo inquilino. Nos próximos cinco anos, a programação será regida pela Sons em Trânsito, agência de nomes como os agora extintos Deolinda, Ana Bacalhau, António Zambujo, Gisela João, Luísa Sobral e Pedro Abrunhosa; representante em Portugal de Benjamin Clementine, Criolo e Mayra Andrade, entre outros; e promotora de festivais como o Festival F, de música portuguesa, em Faro, e de um festival homónimo em Aveiro, onde está sediada.

O diretor Vasco Sacramento realça que esta “é uma sala que nos abre várias possibilidades, com lotações em pé, sentadas e outras configurações, preenchendo uma lacuna que Lisboa tinha em espetáculos de média dimensão, de que muitas cidades cosmopolitas dispõem e que a nossa capital oferece, a partir de agora”. O promotor acrescenta que o renovado Capitólio quer ser complementar e não concorrencial. “Criar programação em rede, em articulação com o resto da cidade e do país; desenvolver uma oferta de serviço educativo, que atraia novos públicos, nomeadamente o infantojuvenil; e estimular o pensamento, com tertúlias e conversas a decorrerem no terraço” são a carta de intenções da Sons em Trânsito para o espaço que pretende ainda “assinalar os grandes acontecimentos da cidade de Lisboa, como a Eurovisão, os Santos Populares ou a Web Summit.”

A sala do antigo Parque Mayer reabrira em 2016 para o Vodafone Mexefest e manteve-se no cardápio do festival no último outono. Este fim de semana, Sérgio Godinho apresentou o novo álbum “Nação Valente” em duas noites e uma matiné no Capitólio. A aposta na pluralidade tanto abre a porta a concertos de jazz como o de Elisa Rodrigues, como ao fadista Marco Rodrigues, a vocalista dos Gossip, Beth Ditto, e festas de música eletrónica como o aniversário da Bloop. A programação não incidirá exclusivamente na música e dá lugar à moda (Style Out Loud) e o festival de humor The Famous Fest, que em 2017 aconteceu na LX Factory, em Alcântara.

Na apresentação, a vereadora da cultura da Câmara Municipal de Lisboa, Catarina Vaz Pinto, explicou a escolha da Sons Em Trânsito pela “proposta de programação pluridisciplinar, que se relaciona com a cidade de Lisboa e preenche lacunas na oferta cultural da cidade” e defendeu a necessidade de a cidade criar “concursos para entidades privadas gerirem e programarem espaços onde se possa criar, numa dinâmica de complementaridade, mais oferta, com maior diversidade cultural”.

Sala fundamental para vida cultural lisboeta, sobretudo no pré-25 de Abril, o Capitólio foi charneira para o teatro de revista e serviu de palco a figuras históricas como Raul Solnado, agora patrono do cineteatro, José Viana, Beatriz Costa, Ivone Silva e Henriqueta Maia. Projetado em 1929 pelo arquiteto Luís Cristino da Silva, foi inaugurado dois anos depois, a 10 de julho de 1931. Apresentava-se como um moderno teatro, music-hall e cinema e é reconhecido internacionalmente pela relevância arquitetónica.

No pós-25 de abril, ficaram célebres as projeções diárias do clássico da pornografia “Garganta Funda” com lotação quase sempre esgotada. Após vários anos encerrado, o processo de requalificação liderado pelo arquiteto Alberto de Souza Oliveira iniciou-se em 2007. Em 2009, o nome de Raul Solnado foi atribuído por unanimidade. A reconstrução foi iniciada em 2012 e ficou concluída no final de 2016, ano em que foi distinguida com o prémio Valmor. Em agosto do ano passado, a Sons em Trânsito venceu o concurso de exploração por cinco anos. O Capitólio tem capacidade para mil pessoas.