Com um olhar de Bruxelas para Portugal, Marinho e Pinto, antigo bastonário da Ordem dos Advogados e atual eurodeputado pelo partido que fundou, o PDR, falou ao i da falta de debate político para acabar com a corrupção e da justiça portuguesa. Os procuradores-gerais da República Fernando Pinto Monteiro e Joana Marques Vidal também não ficaram de fora da análise do advogado, que acredita que muita da sociedade portuguesa vive à base de ódios. Sobre Elina Fraga, ex-colega na ordem, Marinho e Pinto só tem boas palavras, o mesmo não se podendo dizer da ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz e das “clientelas” que afirma ter criado.
O relatório do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO) foi publicado esta semana e diz que Portugal está num patamar “globalmente insatisfatório” no que toca à aplicação das recomendações feitas. Na sua opinião, o que ainda falta mudar na justiça portuguesa?
O grande problema da corrupção é pretender encontrar uma solução no quadro judicial. Só pode haver verdadeiramente uma solução para o problema da corrupção no plano político, por isso é que sempre defendi o debate político sério, honesto, em torno do problema da corrupção. Infelizmente, os partidos políticos dominantes – os dirigentes políticos – não estão interessados em fazer o debate e empurram para a justiça. E a justiça não tem capacidade para resolver este problema. Pode prender A, B ou C, pode instaurar mais ou menos processos, mas a justiça nunca resolve o problema da corrupção, nem nunca resolveu em nenhum país. O debate de que falo não é um combate político feito em torno de motivações exclusivamente partidárias, como o que está a acontecer agora. A corrupção é um problema gravíssimo no Estado de direito, mas é também da própria economia porque as regras do mercado são distorcidas através da corrupção. É por isso que o vice-presidente do Banco Mundial dizia, há cerca de dez anos em Portugal, que se não fosse a corrupção, Portugal poderia ter um índice, estar num plano de desenvolvimento ao nível do da Finlândia ou de outros países do norte da Europa. E não está. Estamos sempre atrasados, sempre na cauda.
E o que sugere como solução?
O que proponho é isto: centrar a punição do crime de corrupção no corrupto, seja ele político, funcionário público, funcionário de uma empresa pública ou magistrado. Quem vende, quem renuncia à sua ética de funcionário funcional em troca de vantagens patrimoniais deve ser punido exemplarmente. Porém, há casos de pessoas que são consideradas corruptoras mas acabam por ser vítimas de extorsão. Porque se não pagarem determinadas comissões ou quantias ao funcionário, não conseguem aprovar um projeto ou participar num concurso público. Quem se deixa corromper não merece contemplações.
E esse debate político, de que forma é que o governo pode fomentá-lo?
É preciso vontade política. Ninguém quer fazer esse debate. Todos empurram o problema da corrupção com a barriga para a justiça. Como é que a justiça pode investigar – com respeito pela legalidade processual – um ato de corrupção entre mim que sou ministro e você que é empresário? Você quer a aprovação deste projeto, mesmo contra o interesse público, eu aprovo-lhe desde que você deposite a quantia tal na conta tal, na offshore tal, no país tal. Quem vai descobrir isto? E quem é que, depois, tem dados para poder estabelecer o nexo de causalidade adequado entre a minha decisão e aquele dinheiro que foi depositado? Não há possibilidade, a justiça não tem possibilidade. Alguns procuradores andam a fazer figuras patéticas, aí a vasculhar toda a vida pessoal das pessoas à procura disto ou daquilo. Não há hipótese. E os políticos sabem isto. Mas deixam para a justiça porque preferem que se degrade o país, a justiça, o próprio prestígio funcional dos magistrados.
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