Gosto muito de jogar ténis e quando engravidei pela primeira vez ainda o fiz enquanto o médico permitiu. Quando nasceu o rebento levávamo-lo no ovo e quando fez dois anos recebeu uma raquete e jogava connosco. Era uma confusão mas ainda dava para nos divertirmos. Várias vezes o campo ao lado estava ocupado por um pai que ia treinar a filha de seis ou sete anos. E aí o prazer de estar a jogar descontraidamente no meio da natureza desvanecia-se. Como eu disse o pai ia treinar a filha, não ia jogar com ela ou passar um bom bocado. Levava aquilo tão a sério que passava o tempo a criticá-la e a exigir demasiado da pobre criança, que devia ter o mesmo prazer naquilo que eu tinha a comer a sopa com a idade dela. Sempre tive ideia de que seria um tenista frustrado que queria através da descendente conquistar o título. Esta, por seu lado, não me parecia ter a mesma ambição e quase aposto que se pudesse escolheria outro lugar para estar naquela altura.
Com o passar dos anos os nossos jogos de ténis foram sendo cada vez mais raros. O bebé do ovo e os que nasceram depois cresceram e há uns meses acedemos a que os mais velhos fossem para o futsal. Implica algum esforço porque os treinos são tarde e em diferentes horários, mas a vontade e entusiasmo eram tantos que não foi possível continuar a resistir. Dá um gozo enorme vê-los a equiparem-se todos entusiasmados, ver os mais novos a passarem os treinos felizes a saltitar atrás da bola e o mais velho concentrado e a esforçar-se para ser um bom jogador. Mas mais uma vez essa alegria começou a ser condicionada por progenitores obstinados. Ao pé de mim costuma sentar-se o pai de um menino de seis anos que passa os treinos a pressioná-lo. «Faz isto, faz aquilo! Péssimo! Para isso estavas a jogar à bola na rua!». O desgraçado do miúdo passa o treino sob tensão e sempre que falha dirige um olhar envergonhado ao pai, que abana a cabeça com desilusão. Se pelo contrário faz uma coisa bem feita o pai fica estático com a cabeça ligeiramente levantada, fazendo lembrar uma esfinge, como se a criança tivesse feito apenas aquilo que lhe competia.
Se a pressão dos pais é tóxica e contraproducente, o que dizer da atitude de alguns treinadores malogrados que gostariam de estar na primeira divisão e gritam de tal forma com as crianças que em torneios as equipas adversárias quase preferem perder a assistir àquele martírio?
Praticar desporto tem à partida vantagens ao nível físico, psicológico, intelectual e social. Isto se a criança praticar uma atividade de que gosta, se tiver prazer na mesma, com um treinador que se sente realizado no que faz e pais que a respeitam, bem como ao treinador e aos árbitros – pais demasiado interventivos deverão ficar fora de cena. Se em vez disto a criança praticar um desporto de que não gosta ou passar os treinos a ser bombardeada com a pressão dos outros, isto criará um sentimento de insatisfação e aniquilará todas as vantagens que poderia ter. Expectativas exageradas e desadequadas são inalcançáveis e malignas. Porque não visam o bem-estar da criança, mas colmatar uma frustração pessoal que ficou mal resolvida e corre o risco de passar para a geração seguinte.
Psicóloga clínica