Violência na família. Gabriel e o caso da família portuguesa em Inglaterra

Casos que vieram a público nos últimos dias podem consciencializar para o fenómeno da violência familiar, mas demasiados detalhes podem ser contraproducentes, avisa psicólogo

Dois casos fatais que envolvem crianças e os seus pais chocaram o mundo nos últimos dias. A morte de Gabriel Cruz Ramírez, um menino de oito anos que esteve desaparecido mais de dez dias em Espanha, até o seu corpo ser encontrado dentro da bagageira do carro da noiva do seu pai no domingo, está a ser investigada pela polícia. Em Inglaterra, foi uma família portuguesa a ser notícia: um homem terá morto a mulher, atirando-se depois de um precipício com os dois filhos. Para o psicólogo forense Mauro Paulino, casos como estes, ao serem amplamente noticiados, podem ter um efeito preventivo e alertar as pessoas para situações que podem acontecer, mas deve haver limites ao que é tornado público.

“Podem ajudar a consciencializar e a despertar para a problemática da violência na família”. Porém, há outros aspetos a ter em conta, sublinha Mauro Paulino. A forma como as notícias são interpretadas pelo público pode suscitar comportamentos violentos, tudo dependerá das características de quem recebe a informação e da forma como esta é filtrada. “Alguém que tenha possivelmente já algumas ideias do género, alguns comportamentos mais agressivos e mais impulsivos, poderá aqui ganhar outra interpretação sobre modos de como fazer o que já vem tendo em mente, mas isso vai depender muito das circunstâncias prévias, das características pessoais da pessoa que está a receber e a filtrar essa informação”, frisa o especialista, que defende que a comunicação social tem um papel importante na prevenção destes comportamentos agressivos. Segundo o psicólogo, como cada pessoa interpreta de forma diferente o conteúdo das notícias, estas não devem revelar demasiada informação e a apresentação de detalhes deve ser ponderada, pois podem ter “um efeito contraproducente”.

Na raiz da violência Quanto ao que poderá estar por trás de casos violentos como os noticiados nos últimos dias, Mauro Paulino diz não ser possível dar uma resposta fechada. Uma psicopatologia ou crenças sustentadas em ideias de vingança ou de ciúme são algumas das hipóteses, sendo que para o psicólogo é mais provável que uma situação destas gere sentimentos de compaixão e solidariedade para com as vítimas do que incentivar comportamentos violentos para com terceiros.

Histórias trágicas Enquanto Gabriel esteve desaparecido, os pais fizeram vários apelos na comunicação social para tentarem encontrar a criança, que acreditavam ainda estar viva. Gabriel fora visto pela última vez no dia 27 de fevereiro em Los Hortichuelas, Espanha, depois de ter saído de casa da avó para se ir encontrar com uns primos.

Segundo avançou o El País, o menino terá sido estrangulado no dia em que desapareceu.

O único indício que levou as autoridades a desconfiarem da atual companheira do pai foi uma camisola da criança, encontrada a cerca de três quilómetros do sítio onde o menino tinha desaparecido e que foi entregue às autoridades. Na passada quarta-feira, a suspeita foi interrogada e o corpo da criança acabou por ser encontrado dentro do carro da mulher, que disse às autoridades estar a mudá-lo de sítio, com medo de que este fosse encontrado. A madrasta acabou por ser detida e as autoridades acreditam que possam existir mais cúmplices envolvidos na morte de Gabriel.

O caso que envolve a família portuguesa é ainda mais dramático. As autoridades britânicas já desencadearam uma investigação e acreditam que o pai terá sido o autor dos crimes, tendo tirado a vida à sua mulher, aos seus dois filhos e a si.

Na passada segunda-feira, a polícia foi chamada a uma casa em Twickenham, Londres. Quando chegaram ao local, por volta das 18h, encontraram o cadáver de uma mulher de 47 anos, que aparentava ter sido esfaqueada. As autoridades tentaram rapidamente encontrar o marido da vítima e os seus dois filhos, de sete e 10 anos, mas sem sucesso.

Na sequência das diligências, a Polícia Metropolitana de Londres foi contactada pela polícia do condado de Sussex que horas antes, a cerca de 140 quilómetros da casa, tinha encontrado três corpos – de um homem e duas crianças – em Birling Gap, uma zona de falésias, muito frequentada por turistas e também sítio frequente de vários suicídios. Apesar de os corpos ainda não terem sido identificados formalmente, as autoridades suspeitam tratar-se da família da mulher encontrada morta em casa.

A investigação ainda está a decorrer e para já as autoridades não detiveram ninguém nem estão à procura de nenhuma pessoa que possa estar ligada a este caso.

Os vizinhos acreditam que a casa seja alugada e admitiram não saber muito sobre a família, que acreditam ser nova na área. Eram “apenas uma família muito normal”, descreveu um dos vizinhos, citado pelo “The Guardian”, acrescentando que não aparentavam ter comportamentos suspeitos e que sempre “se mantiveram para si mesmos”.