O homem que há uma semana revelou o esquema ilegal de recolha de informação no Facebook conduzido pela empresa Cambridge Analytica afirmou esta terça-feira aos deputados britânicos que existe mais uma peça importante no puzzle digital que pode ter favorecido Donald Trump nos Estados Unidos e o Brexit no Reino Unido. Trata-se, segundo Christopher Wylie, da empresa canadiana Aggregate IQ, que operou como um franchise secreto da Cambridge Analytica, recebeu dela os perfis de dezenas de milhões de pessoas recolhidos no Facebook e construiu com eles uma ferramenta capaz de identificar e de se dirigir com precisão aos eleitores republicanos nos Estados Unidos.
A Cambridge Analytica nega ter alguma vez transferido as informações recolhidas no Facebook e, esta terça, a própria Aggregate IQ recusava ter estado alguma vez ligada à firma britânica. Wylie, porém, que viu as suas primeiras denúncias comprovadas pelo próprio Facebook, na semana passada, garantiu ao comité parlamentar que a empresa canadiana construiu um algoritmo com base na informação de Facebook oferecida pela Cambridge que, por sua vez, a recolheu sob o engodo de uma investigação académica e se serviu dela para ajudar as campanhas conservadoras nos Estados Unidos.
“Para mim, está em causa a integridade do processo democrático”, disse Christopher Wylie esta terça-feira, em Londres, ao comité parlamentar que investiga as alegadas operações de manipulação que ocorreram na campanha do Brexit – as suspeitas são muito semelhantes às que existem nos Estados Unidos em relação às eleições de 2016. O antigo consultor informático da Cambridge Analytica falou aos deputados apenas horas depois de Mark Zuckerberg, o fundador e CEO do Facebook, ter feito saber que não iria testemunhar em Westminster.
A ferramenta que a Aggregate IQ construiu para as eleições americanas foi apenas uma das duas revelações desta terça.
A segunda diz diretamente respeito a Londres. Christopher Wylie afirmou que o satélite canadiano da Cambridge Analytica agiu em 2016 como uma máquina de lavagem de dinheiro para a campanha que defendia a saída do Reino Unido da União Europeia, permitindo-lhe ultrapassar o limite legal de despesa. Esta não é a primeira indicação de que grupos defensores da saída britânica esconderam financiamentos ilegais, algo que as autoridades eleitorais britânicas já estão a investigar.
As revelações desta terça-feira, porém, indicam que a Cambridge Analytica ocupou um lugar central na vida política britânica. “Na altura fui falar com a Aggregate, que estava muito, muito satisfeita consigo própria – naturalmente, visto que venceram –, e pedi que me contassem o que fizeram”, lançou esta terça-feira Wylie. “Lembro-me que o Jeff Sylvester [o líder da empresa] me respondeu: foi, cito, ‘totalmente ilegal’.”
Zuckerberg não se seguirá a Christopher Wylie nos testemunhos ao comité britânico. O CEO do Facebook recusou o convite do comité, embora esta terça o “Washington Post” avançasse que Zuckerberg prestará, isso sim, declarações ao Congresso norte-americano. A chefe do gabinete de comunicação do Facebook respondeu por carta ao convite do deputado que lidera a comissão, Damian Collins, dizendo que ela ou outro alto funcionário da rede social podem deslocar-se a Westminster no lugar do líder da maior rede social do mundo. “Certamente, sugiro que ele repense a sua recusa se tem realmente estima por quem usa os serviços da sua empresa”, retorquiu Collins, falando de Zuckerberg.